A Ordem dos Advogados do Brasil, Secção Piauí (OAB-PI), ajuizou um pedido de tutela cautelar em face do Município de Nossa Senhora de Nazaré-PI, que por meio da Lei Complementar nº 158/2017 extinguiu seu Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) e incorporou os rendimentos e bens pertencentes do RPPS ao tesouro municipal, a fim de que os valores sejam utilizados no pagamento de despesas que não estão relacionadas aos compromissos previdenciários.
De acordo com a OAB-PI, a lei municipal fere a legislação federal (Lei n.º 9.717/98 e Lei nº 9.796/99) que trata sobre a extinção do Regime de Previdência, que determina que os recursos previdenciários do RPPS em extinção somente poderão ser utilizados para o pagamento de benefícios previdenciários concedidos e a conceder; para a quitação dos débitos com o Regime Geral de Previdência Social; para a constituição ou manutenção do fundo previdenciário e para pagamentos relativos à compensação previdenciária entre regimes.
O artigo 5º da referida lei municipal, no entanto, dispõe que os valores, bens, ativos e seus rendimentos poderão ser utilizados para a quitação de débitos com os servidores, referentes a rescisões, folhas de pagamento em atraso e direitos trabalhistas. Além disso, nessa quinta-feira (31) os recursos que somam quase 2,5 milhões de reais foram transferidos para a conta única do Tesouro Municipal, sendo extinta a conta vinculada ao RPPS.
- Foto: Marcelo Cardoso/GP1 OAB-PI
“Não se acaba com um regime de previdência da noite para o dia, é preciso estabelecer um processo de extinção. Além disso, o município está retirando o dinheiro de uma fonte específica e colocando no tesouro municipal, sujeito à prefeitura utilizá-lo da maneira que lhe for mais conveniente, como prevê a lei que está sendo questionada. O dinheiro é do servidor e não da prefeitura, e queremos que seja garantido que ele seja usado no pagamento de aposentadorias e pensões futuras. E para isso, é necessário que se preserve todos os valores, bens e rendimentos vinculados ao regime em extinção”, frisou o presidente da Comissão Nacional de Direito Previdenciário, Chico Couto.
Segundo o advogado Alex Sertão, especialista em Direito Previdenciário, a extinção de regimes próprios deve ser vista com muita cautela e cuidado, porque eles têm a responsabilidade de pagar as aposentadorias e pensões dos servidores. "Quando se extingue um regime próprio, muitos servidores já se aposentaram naquele município. O município, portanto, vai estar com a obrigação de pagar para sempre aquelas aposentadorias e pensões que foram concedidas enquanto o regime próprio existiu. E aqueles demais servidores que não conseguiram se aposentar no regime próprio terão que ir para o regime geral do INSS, que também vai precisar das contribuições do regime que está sendo extinto para poder, futuramente, pagar as aposentadorias desses servidores que foram para lá, a gente chama isso de compensação previdenciária", explica.
Segundo Sertão, isso é muito dispendioso, podendo causar um enorme prejuízo não só para os servidores como também para o município. "Um regime próprio é extinto porque é mal gerido, porque não houve preocupação com o equilíbrio financeiro e atuarial. E a culpa é do gestor. Os gestores não fazem o dever de casa, não aplicam direito o dinheiro, não repassam as contribuições previdenciárias para o cofre do regime próprio. Além disso, muitos gestores pegam o dinheiro e gastam em outras destinações, o que é proibido. Tudo isso junto, faz com que o regime próprio quebre. Muitas vezes, o regime próprio não tem a mínima viabilidade atuarial pra ser criado, mas mesmo assim o prefeito cria", completou o especialista.
- Foto: Marcelo Cardoso/GP1 Advogado Lucas Villa
Para o presidente em exercício da OAB-PI, Lucas Villa, tal situação deve ser imediatamente revertida, sob pena de dano ao erário ou realização de despesas não elegíveis que prejudicarão os servidores públicos municipais e pensionistas do RPPS em extinção. “A transferência dos valores do fundo de previdência para a conta única do Tesouro Municipal e a iminente utilização estranha à sua finalidade afetaria diretamente os servidores que durante anos contribuíram com a previdência própria”, disse.
“É inadmissível que um gestor pretenda extinguir um regime de previdência com o objetivo de utilizar os seus recursos para outra destinação que não seja o pagamento dos benefícios previdenciários. A apropriação dos recursos dos servidores é inidônea. Em razão disso, a OAB Piauí ajuizou o pedido cautelar, solicitando que o Município de Nazaré do Piauí crie uma conta vinculada ao RPPS em extinção e transfira para ela os quase dois milhões e meio, que só poderão ser utilizados para o pagamento de débitos previdenciários”, asseverou o presidente da OAB-PI, Chico Lucas.
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