Mais de 20 pessoas de uma mesma família que moram em um terreno do Grupo Claudino S/A, há cerca de 40 anos, estão vivendo momentos de tensão por medo de serem retiradas de suas moradias a qualquer momento, no bairro Planalto Ininga, zona leste de Teresina.
O imóvel em questão trata-se de uma área localizada na Rua Cícero Carvalho, onde está sendo erguida uma verdadeira mansão, no mesmo espaço em que a família vive atualmente.
Em decisão do último dia 17 de janeiro de 2020, em ação de reintegração de posse movida pelo Grupo Claudino, a juíza de direito da 8ª Vara Cível, Lucicleide Pereira Belo, deferiu pedido consolidando a posse e a propriedade plena em favor do grupo empresarial, determinando que a matriarca da família, Maria da Conceição Pereira da Silva, de 63 anos, desocupasse o imóvel no prazo de 60 dias, sob pena de multa diária de R$ 100,00 até o limite de R$ 5 mil.
A Defensoria Pública, por sua vez, recorreu e conseguiu que a decisão de reintegração fosse suspensa em função da pandemia da Covid-19.
No entanto, em agravo de instrumento interposto pela defesa do Grupo Claudino, no dia 23 de abril deste ano o desembargador José Gomes manteve a suspensão da reintegração de posse pelo prazo improrrogável de 30 dias, e como o prazo já se exauriu, a família volta a correr risco de ser despejada.
O GP1 conversou com a idosa Maria da Conceição. Ela contou que chegou no terreno no ano de 1982, a pedido do empresário João Claudino. De lá para cá a família dela cresceu e nos últimos anos membros da família Claudino começaram a construir um imóvel no mesmo terreno, exigindo que Maria da Conceição se retirasse do local.
Hoje o terreno conta com sete moradias precárias, onde as 22 pessoas vivem. Os moradores são filhos, netos e bisnetos de dona Maria. “A gente morava em um terreno na Rua Benigno do Rego Lemos, aqui na zona leste, que também era dele. Esse terreno foi vendido para um rapaz onde hoje existe uma padaria. Meu marido foi falar com ele e disseram que havia esse terreno. Depois de olhar, meu marido voltou e disse que queria o terreno e então João Claudino perguntou se meu esposo estava em condições de construir uma casa de taipa. Ele disse que não estava e então seu Claudino disse que daria a telha, o barro, as madeiras, e as varas para fazer a casa. Na época eu morava com meu marido e nossos filhos. Quando eu vim pra cá eu trouxe 4 filhos e aqui tive mais 5. Os filhos foram crescendo, casando e construindo as casas por aqui, tudo simples, de taipa. Algumas já caíram, mas nós já levantamos de novo”, explicou a idosa.
Dona Maria contou que o intuito do empresário João Claudino era proteger seu terreno de possíveis invasores e, por esse motivo, ofereceu o imóvel e deu condições para que ela permanecesse ali. “Ele deu esse terreno para a gente morar, cuidar e não deixar ninguém invadir, assim eu fiz. Tinha gente que saía daqui com raiva porque chegava com as carroças carregadas com materiais e a gente não deixava ninguém invadir”, seguiu a matriarca.
Ameaças
A idosa contou que antes da pandemia a situação piorou, depois que um dos filhos de João Claudino, o empresário e ex-senador João Vicente Claudino, segundo ela, começou a construir uma mansão. Conforme a Dona Maria, desde o início da construção, em 2019, as famílias entraram em pânico com medo de serem despejadas do local, pois não têm para onde ir.
“Há dois anos começaram a levantar essa casa do João Vicente Claudino, foi aí que começou o tormento. A ameaça é de nos tirar daqui com polícia, que está chegando gente com trator para derrubar tudo, que quando a gente estiver dormindo vai acordar com telha caindo em cima da gente”, desabafou dona Maria.
A matriarca contou ainda que as ameaças são frequentes. Por último, a idosa relatou que um policial militar aposentado, que estaria fazendo a segurança da obra, agiu como forma de amedrontar os moradores. “O nome do ex-senador [João Vicente Claudino] é sempre usado, que tudo que acontece aqui é ordem do dono. Chegou ao ponto de vir gente armada aqui ameaçar a gente, mostrando arma e dizendo que não era pra ninguém se exaltar, porque ele estava armado. Dizia que era policial aposentado, mas ainda tinha direito de fazer e acontecer. Eu não tenho condições de sair daqui, pois não tenho como comprar um terreno”, relatou Dona Maria.
Filhos não têm para onde ir
A nora de dona Maria, Francinete da Silva, contou ao GP1 que quando João Claudino era vivo tentou falar com o empresário para regularizar a situação, mas não obteve sucesso. Francinete pediu que ele cedesse algum outro terreno para que as famílias pudessem morar. “Eu fui fazer essa proposta para o seu João quando ele era vivo, mas ele debochou da minha cara e perguntou se eu tinha R$1.000,00 para dar pra ele, que assim ele compraria um terreno para mim”, relatou Francinete.
“O que nós queremos é que ele nos dê um local para a gente morar. Se ele chegar e disser que tem um terreno e que nós podemos entrar nele, morar eu vou. Eu não tenho é condições de levantar uma casa, pois eu vivo com R$ 200,00 e tenho três filhos”, continuou Francinete.
Caso foi parar na Justiça
Francinete da Silva contou que o caso foi parar na Justiça e lá a assessoria jurídica de João Vicente Claudino alegou que somente dona Maria vivia no local. A dona de casa então reuniu provas de que outras seis famílias também moram no terreno e aguarda a decisão da Justiça.
“As duas audiências que houveram foram a favor dele, com a alegação de que somente dona Maria vive aqui dentro. Então, a Defensoria Pública nos pediu que a gente procurasse provas de que nós existimos aqui. Foi o que eu fiz, fui atrás de provas e consegui, levei na semana passada e agora estamos esperando a decisão deles”, continuou Francinete.
Francinete da Silva disse ainda que suas duas filhas, de 9 e 10 anos, estão apavoradas com a possibilidade das casas serem demolidas. Atualmente ela está desempregada e paga as contas de casa com um auxílio de R$ 200,00 do Governo Federal.
“Minhas filhas vivem apavoradas, com medo de toda hora vir alguém aqui e derrubar nossa casa. Elas estão sendo acompanhadas pelo psicólogo, tomam remédio controlado. É uma situação muito difícil. Eu sou dona de casa, desempregada, vivo com três filhos com apenas R$ 200,00”, finalizou Francinete.
O que diz assessoria jurídica de João Vicente Claudino
O GP1 tentou contato com o empresário João Vicente Claudino desde a última sexta-feira (27), quando nossa equipe visitou o local, mas até esta segunda-feira (30) nenhuma das ligações foram atendidas.
Procurada pela nossa reportagem, nesta terça-feira (31), a assessoria jurídica do empresário afirmou que só se posicionará sobre o caso nos autos do processo que está tramitando na Justiça.
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