Desde 2003, o Brasil celebra no dia 20 de novembro o Dia da Consciência Negra, data que marca a morte do líder quilombola Zumbi dos Palmares, que ocorreu em 1695. Nesse período acontece o maior número de eventos e espaços para tratar da questão racial e principalmente do racismo ainda existente no país.
Apesar de a discriminação racial ainda ser evidente, é possível ressaltar alguns avanços no que diz respeito a garantia de direitos iguais e combate ao racismo. Dentre essas conquistas, se destaca a política de ações afirmativas.
De acordo com o Art. 15. do Estatuto da Igualdade Racial, instituído pela Lei nº 12.288/10, o poder público deve adotar programas de ações afirmativas, de maneira a garantir o direito das pessoas que se auto declaram negras, pardas e indígenas, oriundas de escola pública, ingressarem no ensino superior, considerando que, historicamente, tais pessoas são desprovidas de privilégios e não têm acesso a uma educação básica de qualidade, que possa garantir uma paridade entre a parcela mais privilegiada da sociedade.
- Foto: Thais Guimarães/GP1Lucas Viana, estudante de Direito da UFPI
Baseado neste estatuto, foi decretada no Brasil em 2012 a Lei nº 12.711/2012, a Lei de Cotas, que determina que "as instituições federais de educação superior vinculadas ao Ministério da Educação reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas". Dessa maneira a cota se divide em quatro critérios: pretos, pardos ou indígenas de baixa renda e de escola pública; pretos, pardos ou indígenas de escola pública sem recorte de renda; pessoas de escola pública e de baixa renda; e pessoas de escola pública.
Uma pesquisa desenvolvida pelo estudante Lucas Vinícius Viana, graduando em Direito pela Universidade Federal do Piauí (UFPI) analisou o acesso de estudantes negros aos cursos mais concorridos da UFPI, considerados de “alto prestígio social”, a partir do primeiro período de 2013 através de ações afirmativas.
Lucas Viana concedeu entrevista ao GP1 e apresentou detalhes do estudo, que é parte de um projeto orientado pela professora Maria Sueli Rodrigues, do Departamento de Ciências Jurídicas da UFPI. “A intenção era mapear o perfil dos alunos cotistas negros que ingressaram na UFPI a partir de 2013 pela reserva estipulada pela lei de cotas. Era preciso entender quem eram essas pessoas, quais as suas necessidades na universidade e em que medida essa política [de cotas] estava sendo efetiva, no sentido de dar mobilidade social a essas pessoas”, declarou.
Os seis cursos analisados foram Arquitetura, Direito, Engenharia Civil, Engenharia Elétrica, Engenharia Mecânica e Medicina. “Esses cursos foram escolhidos por serem considerados elitizados, porque nesses cursos é que está a maior parte das pessoas que estão no 1% dos mais ricos dos trabalhadores brasileiros. Os cursos de elite são o com menor proporção de negros”, explicou o estudante.
A pesquisa se deu por amostra, com 90 pessoas, 50 cotistas e 40 não cotistas. “O objetivo era comparar o perfil socioeconômico das pessoas que não entraram por cotas com o das que entraram por cotas e se auto declararam pretas ou pardas. A pesquisa se baseou nessa amostra, mas também analisamos oito editais do SISU, de 2013.1 a 2016.2, para sabermos o número de vagas ofertadas pelo sistema de cotas nesses seis cursos”, informou.
De 2013 a 2016, esses seis cursos ofertaram, na UFPI, 1.350 vagas para ampla concorrência e 618 vagas para cotas. Dessas 618 vagas, 506 foram para cotas sócio raciais e 102 para cotas sociais.
O estudo concluiu que os cotistas negros representam 88% de todos os cotistas que ingressaram no período analisado, e que 94,1% deles não recebem bolsas de assistência estudantil. A pesquisa traçou o perfil do cotista negro: oriundo de escola federal no ensino médio, com renda familiar de até 3 salários mínimos e rendimento acadêmico acima de 8,0 pontos.
Lucas Viana, que é militante do movimento de negritude Atitude Preta, avalia como positiva a política de cotas. “As ações afirmativas conseguem inserir estudantes negros na universidade, mas a ausência de políticas de assistência estudantil nas instituições dificulta a permanência”, finalizou.
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