Segunda maior capital do País, o Rio de Janeiro terá segundo turno entre o ex-prefeito Eduardo Paes (DEM) e o atual, Marcelo Crivella (Republicanos). Mesmo com rejeição de mais de 60%, o mandatário conseguiu ter 21% dos votos e se cacifar para a disputa contra Paes, que venceu o primeiro turno com 37%. Até o fechamento deste texto, 95% das urnas cariocas haviam sido apuradas.
Crivella se aproveitou da fragmentação de votos nos partidos de esquerda. A Delegada Martha Rocha (PDT) está em terceiro, mas a petista Benedita da Silva aparece praticamente empatada, ambas com 11%. As militâncias dos dois partidos de esquerda tentaram pregar o chamado voto útil nos últimos dias, o que não funcionou.
O prefeito era considerado o adversário ideal por Paes, que já estava com a ida para o segundo turno encaminhada. A avaliação é de que a rejeição dos cariocas a Crivella facilita a vida do demista, que tende a buscar pouco os holofotes nas próximas duas semanas - ele deve “jogar parado”, de modo a explorar o cenário vantajoso.
Para ir ao segundo turno, Crivella se agarrou ao bolsonarismo e conseguiu, nas últimas duas semanas, gravar vídeos com o presidente Jair Bolsonaro, que declarou voto nele. A estratégia de buscar o voto ultraconservador, apelando para temas morais e de pouca relação com a cidade, foi o mote da campanha do bispo licenciado da Igreja Universal.
Durante a campanha, Paes buscou minar a ascensão de Martha, que começava a apresentar crescimentos nas pesquisas. O fato dela ter rejeição baixíssima, na casa dos 10%, ligou um alerta entre aliados do ex-prefeito, que começou a veicular propagandas de desconstrução da imagem da delegada.
Benedita, por outro lado, surpreendeu e foi quem demonstrou ter herdado mais votos do campo progressista nos últimos dias. Sem lançar candidatura própria na cidade desde 2008, o PT conseguiu ocupar um espaço que vinha sendo do PSOL, representado nas últimas duas eleições por Marcelo Freixo. A candidata do partido, Renata Souza, fez apenas 3% até aqui.
O próprio mapa de votos em Benedita, que se deu melhor áreas mais ricas da cidade, como a zona sul, mostra que os eleitores de Freixo nas últimas eleições parecem ter migrado para a petista. O PT não fazia mais de 10% no Rio desde 2000, quando a própria Benedita conquistou 22%. A história da candidata de 78 anos se confunde com a do partido no Rio e mostra a enorme dificuldade de renovação pela qual a legenda passa
A campanha de Paes se concentrou em explorar a má avaliação da gestão Crivella e fazer uma comparação com os oito anos que ele governou a cidade. O principal slogan diz que “o Rio vai voltar a dar certo”. Nessa linha, outra abordagem buscou destacar sua experiência administrativa, em contraponto a Crivella e ao governador afastado Wilson Witzel (PSC), que o derrotou na eleição estadual de 2018 como azarão. “O Rio não pode eleger um novo Crivella ou um novo Witzel”, martelou a todo momento o ex-prefeito, de modo a evitar o surgimento de um outsider.
“Hoje é o momento em que a população vem soberana para as urnas e decide quem vai ser o futuro prefeito da cidade. O que eu tenho repetido é isso: o Rio não pode mais arriscar. Infelizmente a cidade escolheu um prefeito que nos últimos anos destruiu a nossa cidade, então a gente precisa ir com muita consciência para as urnas “, disse Paes ao votar na manhã de ontem, pedindo que os eleitores não permitam que "pessoas despreparadas ou farsantes governem a cidade."
Paes também descartou qualquer tipo de nacionalização da disputa carioca. “Não sou cabo eleitoral de ninguém, tá doido”, disse em entrevista ao Estadão. A ida com Crivella ao segundo turno também o ajuda nesse sentido, já que Bolsonaro manterá o apoio ao atual prefeito. Havia o rumor de que Paes receberia um aceno do presidente caso disputasse a prefeitura contra uma das candidatas da esquerda, querendo ele ou não esse gesto. Quando declarou voto em Crivella pela primeira vez, na live semanal, o mandatário do Planalto disse que o ex-prefeito era um bom administrador.
Assim como Crivella, Benedita surfou a nacionalização e inseriu o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na campanha. Ele não foi ao Rio por causa da pandemia, mas gravou vídeos, pediu votos na sua ex-ministra e enviou ao Rio o ex-presidenciável Fernando Haddad e seu fotógrafo oficial, Ricardo Stuckert. O ex-mandatário manteve boas votação no Rio desde que virou presidente, assim como Dilma Rousseff. Haddad, não; perdeu até para Ciro Gomes (PDT) no primeiro turno no município.
Ciro, inclusive, apareceu menos do que se esperava na campanha de Martha Rocha, mesmo tendo obtido 19% no Rio em 2018. A ideia, sabendo que o eleitorado da delegada não é necessariamente de esquerda, era evitar repelir cariocas mais de centro ou de direita que simpatizam com ela.
Candidatos projetam segundo turno
Os eleitos para o segundo turno fizeram breve comentários à imprensa na noite deste domingo, em meio à demora para a confirmação dos resultados. "O segundo turno é mera comparação entre quem governou com muito dinheiro e quem governou com pouco, e o que cada um fez", alegou Crivella. "Tenho certeza de que os números que temos vão mudar. Minha rejeição é de gestão, não é pessoal. Quando os eleitores souberem tudo o que fizemos, isso pode ser revertido."
Paes, por sua vez, falou que a cidade “funcionou” durante seus mandatos, ao contrário do que teria ocorrido nos quatro anos de Crivella.
"Quero chamar a atenção especialmente que, nesta eleição, no segundo turno vamos ter que continuar discutindo entre uma administração, uma prefeitura do Rio que funcionou, que deu resultado, que as pessoas tinham acesso à atenção básica na saúde, às clínicas da família, ao BRT, aos serviços básicos da prefeitura sendo prestados de forma adequada, contra uma administração que todos nós vimos e percebemos, que deixou de prestar serviços à população, que abandonou a população de nossa cidade, e que fez com que a população sofresse", comentou.
"O carioca sabe a tragédia que representa a má gestão do Crivella."
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