O governo Jair Bolsonaro decidiu criar uma nova força de fiscalização, com poder de polícia, para atuar na região amazônica. O plano é ter uma “Força Tática da Amazônia", dedicada de forma integral e permanente ao combate a crimes na floresta, em paralelo ao trabalho que já é realizado pelo Ibama e pelo Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), do Ministério do Meio Ambiente.
O Estadão apurou que o plano, que é liderado pelo vice-presidente da República, o general Hamilton Mourão, já é estudado pela área jurídica do governo e pelo Ministério de Meio Ambiente, para buscar uma forma de viabilizar a nova força. A ideia é que esse novo grupo seja formado, majoritariamente, por militares inativos, com experiência na região.
Diferentemente do que ocorre hoje com a presença de militares na região, que têm apenas poder de repressão, esse novo grupo terá autorização para prender, multar e apreender ou destruir equipamentos, funções que hoje são restritas a agentes do Ibama e do ICMBio que atuam em campo. Por essa razão, esse grupo não pode ser vinculado ao Ministério da Defesa, mas sim ao Meio Ambiente.
Internamente, o governo busca uma solução jurídica para viabilizar a criação da nova força, o que poderá ocorrer por meio de estruturas existentes. A análise do governo para tirar o plano do papel inclui a possibilidade de o governo enviar proposta ao Congresso - por medida provisória ou projeto de lei -, alterando o estatuto do próprio Ibama, para permitir a criação de um “braço” distinto do órgão para realizar essa tarefa. Se for necessário, o governo poderá até recorrer à criação de um novo órgão federal dentro da pasta. Na prática, o que o governo pretende é desvincular esse novo agente do Ibama ou ICMBio, mantendo-o um grupo fechado, para atuar exclusivamente em operações na Amazônia.
O Ministério do Meio Ambiente não quis comentar o assunto. A vice-presidência da República também não se manifestou até o fechamento deste texto.
A nova força policial, planejada por Mourão e endossada pelo ministro do Ambiente, Ricardo Salles, será formada, basicamente, por militares da reserva que possuam experiência na região. O Estadão apurou que o plano não é criar uma base física permanente na Amazônia, por razões de segurança. Esse grupo deve ser sediado em Brasília, mas voltado em tempo integral para ações na região, com deslocamento sempre que necessário.
Independentemente de qual será a estrutura administrativa do novo grupo, o governo ainda enfrenta restrições orçamentárias para viabilizar o plano. A ideia do governo é que a “Força Tática da Amazônia” seja contratada por meio de concurso público, o que tem sido vetado reiteradamente pelo governo, em todas as áreas.
Apesar das dúvidas, a cúpula do governo que atua no projeto afirma que a decisão está tomada, que o vice-presidente está convencido de que essa é uma “necessidade” e a “única alternativa” para ter uma fiscalização permanente na Amazônia. A expectativa inicial é de algo entre 100 a 150 servidores sejam contratados para essa função em 2021.
Nesta quarta-feira, 16, Hamilton Mourão disse que o governo precisa ampliar sua atuação na região, “principalmente a questão da recuperação da capacidade operacional do Ibama, ICMBio e Funai”. O comentário foi uma repercussão às propostas apresentadas por 230 empresas do agronegócio e organizações não governamentais do meio ambiente, que incluam pedidos para reforçar as estruturas do Ibama e ICMBio.
O fato, porém, como apurou o Estadão, é que o governo não está preocupado, neste momento, em ampliar os quadros desses órgãos, mas em criar um novo grupo independente, formado majoritariamente por pessoal militar. Sem detalhar o novo plano, ele, que comanda o Conselho da Amazônia, disse que “temos de ter uma solução, porque, seu faço um concurso agora para aumentar a capacidade do Ibama e do ICMbio, não posso dizer que essa turma vai trabalhar só na Amazônia pelos próximos dez anos, porque é contra a legislação atual. Então, tenho de criar um novo mecanismo para contratar gente, para que essa turma saiba que só vai para a Amazônia. Senão, fica dois anos na Amazônia e depois vai querer ir para Fernando de Noronha”.
Ibama sofre com déficit de equipe
Reportagem publicada pelo Estadão em agosto revelou que o Ibama, que é o principal órgão do governo federal na proteção da maior floresta tropical do mundo, possui atualmente 591 agentes ambientais para enfrentar o avanço do crime ambiental, e isso não só na Amazônia, mas em todo o País.
Dados oficiais do órgão mostraram que o quadro atual de agentes é 55% inferior ao que o instituto detinha dez anos atrás. Em 2010, eram 1.311 fiscais em atuação. Trata-se do pior cenário de fiscalização desde a fundação do Ibama, em 1989.
A atuação desse grupo de profissionais é mobilizada para diferentes localidades do Brasil, conforme a necessidade e época do ano. A Amazônia costuma concentrar a maior parte desses servidores, principalmente no atual período de seca. Esse deslocamento, na prática, também cumpre o papel de proteger o fiscal, para não correr riscos de permanecer integralmente em uma região onde atua no combate ao crime.
Em junho, o presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, chegou a enviar ofício ao ministro Salles descrevendo a situação crítica do órgão e pedindo autorização para realizar concurso. Este previa a contratação de servidores não só para a fiscalização, mas também para analistas e técnicos administrativos. O Ibama solicitava, ao todo, a recomposição de 2.311 servidores, dos quais 970 poderiam atuar nas ações em campo. O impacto dessas contratações no orçamento de 2021 seria de R$ 66,6 milhões. Salles repassou o pedido ao Ministério da Economia, que não autorizou o concurso.
O quadro atual de servidores do Ibama, em todas as suas áreas, soma 2.800 funcionários, número que também remete ao momento mais crítico da instituição. Em 2007, por exemplo, chegou a ter 6.200 empregados.
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