Pelo menos 17 pessoas morreram em Cabul, capital do Afeganistão, após integrantes do Talibã atirarem para o alto em comemoração à suposta conquista da província de Panjshir, último reduto de oposição ao grupo islâmico. O gesto, que também deixou 41 civis feridos, foi desaprovado pelo porta-voz do próprio grupo, informaram agências de notícias afegãs neste sábado, 4.
A celebração dos combatentes começou depois que se espalharam rumores de que o Talibã havia tomado o controle de Panjshir, cerca de 80 quilômetros ao norte da capital. Líderes da resistência, porém, negam que a província tenha caído, e o movimento islâmico não fez nenhum anúncio oficial a esse respeito. Desde segunda-feira, quando as últimas tropas americanas deixaram o país, a região é palco de combates entre o grupo fundamentalista e a Frente Nacional de Resistência (FNR).
O principal porta-voz do Talibã, Zabihullah Mujahid, usou o Twitter para repreender o comportamento dos combatentes. "Agradeçam a Deus em vez de atirar para o alto", disse. "As balas podem ferir civis, então não atirem sem necessidade."
Formação de governo
Anteriormente marcada para sexta-feira, a apresentação de um governo por parte do Talibã foi novamente adiada neste sábado, e não tem data para acontecer. Quase três semanas já se passaram desde que os fundamentalistas recuperaram o controle do Afeganistão, e o anúncio de um Poder Executivo formado pelo grupo é esperado porque pode dar pistas sobre como serão os próximos anos no país.
A principal explicação para o atraso é a situação em Panjshir, cujo domínio é atualmente o maior desafio enfrentado pelo grupo, à medida que tem havido confrontos ferozes com as forças de resistência na província. Refugiado no local, o ex-vice-presidente Amrullah Saleh disse que uma "situação muito difícil" está ocorrendo, em uma mensagem de vídeo transmitida na noite de sexta-feira. Ele assegurou que a "resistência continua e continuará".
De acordo com Ahmad Masud, que lidera a oposição no vale, o Talibã propôs dois cargos em seu futuro governo a membros da FNR, em troca pelo controle da província. "Como queremos um futuro melhor para o Afeganistão, nem sequer consideramos a oferta", disse na quarta-feira o filho do comandante Ahmed Shah Masud, assassinado em 2001 pela Al Qaeda.
Desde a sua volta ao poder, no final de uma ofensiva relâmpago que pegou o governo e a comunidade internacional desprevenidos, o Talibã tem tentado retratar uma imagem mais contida, com vários gestos de abertura. Eles prometeram, por exemplo, formar um governo "inclusivo", e nas últimas semanas multiplicaram seus contatos com personalidades afegãs que se opunham a eles, como o ex-presidente Hamid Karzai e o ex-vice-presidente Abdullah Abdullah.
Quanto aos direitos das mulheres — duramente reprimidos durante o primeiro regime do grupo, de 1996 a 2001 —, o Talibã disse que eles serão respeitados, desde que elas "cumpram as leis islâmicas". Eles também deram a entender que não haverá ministras no governo, e que a presença feminina será relegada a escalões inferiores.
Além das questões sociais e de segurança, também é incerto se o Talibã conseguirá endireitar a economia do país, que se encontra em péssimo estado após quatro décadas de conflito e privada de ajuda internacional. “O Afeganistão enfrenta uma catástrofe humanitária iminente”, alertou na sexta-feira a Organização das Nações Unidas (ONU), que vai realizar uma reunião em 13 de setembro para discutir o aumento da ajuda humanitária destinada ao país. O Catar, que está na vanguarda das negociações com o movimento islâmico, disse que planeja abrir "corredores humanitários" nos aeroportos afegãos em um futuro próximo.
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