O Parlamento do Iraque aprovou uma medida para expulsar as tropas americanas do país neste domingo, 5, em reação ao ataque que matou o general iraniano Qassim Suleimani. Os legisladores pedem ao governo iraquiano para acabar com o acordo pelo qual Washington enviou forças para o Iraque há mais de quatro anos para ajudar na luta contra o grupo Estado Islâmico.
A retirada de cerca de 5,2 mil soldados americanos pode aleijar a luta contra o Estado Islâmico e permitir o seu ressurgimento. A maioria dos 180 parlamentares presentes votaram a favor da resolução. Ela foi apoiada pela maioria dos membros xiitas do Parlamento, que possuem a maioria das cadeiras. Muitos legisladores sunitas e curdos não apareceram para a votação, aparentemente porque eles se opõem à abolição do acordo.
O primeiro-ministro iraquiano Adel Abdul Mahdi havia pedido ao parlamento que tomasse "medidas urgentes" para forçar a retirada de tropas estrangeiras.
Em discurso no Parlamento, ele recomendou que o governo estabelecesse "em nome da soberania nacional" um calendário para a retirada das tropas estrangeiras, incluindo os integrantes da coalizão liderada pelos EUA para combater o Estado Islâmico. "O que aconteceu foi um assassinato político", disse Abdul.
Abdul Mahdi disse que tropas estrangeiras estavam no Iraque para treinar suas forças e ajudar a atacar os remanescentes do Estado Islâmico "sob a supervisão e aprovação do governo iraquiano".
"O Iraque não pode aceitar isto", disse ele. "Nenhuma tropa estrangeira está autorizada a conduzir suas próprias ações militares dentro do Iraque."
A declaração do primeiro-ministro vem depois de um anúncio da coalizão liderada pelos EUA, que afirmou ter parado sua missão de treinamento no Iraque devido a "repetidos ataques com foguetes nos últimos dois meses" da milícia apoiada pelo Irã, Kataib Hezbollah. Agora a coalizão se concentraria em proteger suas bases de ataques, informou o comunicado. A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) anunciou neste sábado, 4, a suspensão de seus programas de treinamento.
Enquanto isso, o Irã disse neste domingo, 5, que limitaria sua resposta ao ataque contra Suleimani a alvos militares dos EUA.
"A resposta com certeza será militar e contra locais militares", disse Hossein Dehghan, o conselheiro militar do líder supremo do Irã, em entrevista à CNN. "A única coisa que pode acabar com este período de guerra é os americanos receberem um golpe igual ao golpe que infligiram".
Os comentários de Deghan foram divulgados após o presidente Donald Trump ameaçar no Twitter atacar "52 locais iranianos... alguns de nível muito alto e importante para o Irã e para a cultura iraniana" caso Teerã retalie contra os americanos na região. O Irã tem 24 locais na lista da Organização das Nações Unidas (ONU) de patrimônios culturais mundiais.
Dehghan disse que, se Trump levar a cabo suas ameaças, "nenhum militar americano, nenhum centro político americano, nenhuma base militar americana, nenhum navio americano estará seguro".
Na Arábia Saudita, a embaixada dos EUA lançou um alerta de segurança neste domingo aconselhando os americanos sobre "o aumento do risco de ataques com mísseis e drones" contra alvos civis e militares.
Os Estados Unidos culparam o Irã por um duro ataque de drones e mísseis às instalações petrolíferas do estado saudita em setembro, uma ação que derrubou metade da produção de petróleo do país.
No Irã, o corpo de Suleimani foi transportado em um caixão com a bandeira do Irã para a cidade de Ahvaz, no sudoeste do país, após uma procissão fúnebre em Bagdá e nas cidades xiitas gêmeas do Iraque, Karbala e Najaf. Mais tarde, o corpo foi levado para a cidade de Mashhad, lar do santuário do Imã Reza, uma figura venerada no islamismo xiita. O Irã é governado por uma teocracia xiita.
Imagens de Ahvaz transmitidas pela televisão estatal iraniana mostraram dezenas de milhares de pessoas vestidas com capas negras, agitando bandeiras e entoando slogans religiosos. O canal também divulgou um vídeo de Suleimani mais jovem recitando poesia persa. A Agência de Notícias da República Islâmica do Irã descreveu a cena como "gloriosa".
"Todas as escolas e empresas estão fechadas hoje — ele era popular no Irã e ficou ainda mais popular agora", disse Farnaz, de 33 anos, engenheira de computação e residente de Ahvaz. Como outros iranianos contactados pela reportagem, ela falou na condição de que seu nome completo não fosse usado para que pudesse falar livremente.
"As pessoas aqui se sentem inseguras e ameaçadas por outros países há décadas, por isso viam Suleimani como um comandante importante e carismático que estava protegendo nossa segurança", disse ela.
Ainda assim, Ahvaz e outras cidades da província de Khuzestan, rica em petróleo, lar de uma grande minoria étnica árabe, têm um histórico de revolta contra o governo. Em novembro, quando protestos sobre os cortes nos subsídios de combustível dominaram as cidades iranianas, as forças de segurança lançaram uma repressão brutal e abateram dezenas de manifestantes em Mahshahr, ao sul de Ahvaz. No domingo, um vídeo não verificado postado online mostrou jovens mascarados incendiando um cartaz em comemoração a Suleimani.
A procissão em homenagem ao comandante morto continuará na segunda-feira para a cidade sagrada de Qom e seguirá para a capital, Teerã, onde o Líder Supremo Ali Khamenei liderará as orações na cerimônia. Suleimani será enterrado na sua cidade natal, Kerman, na terça-feira.
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