Dezessete capitais registraram abstenção maior que a média nacional de 23,14% no primeiro turno das eleições 2020. Porto Alegre (RS), com 33,08%, e Rio de Janeiro (RJ), com 32,79%, foram as capitais em que mais eleitores deixaram de ir às urnas. A média nacional é quase seis pontos porcentuais maior que o registrado nas últimas disputas municipais, em 2016. Na eleição mais recente, a de 2018, a abstenção no primeiro turno ficou em 20,33%.
O Tribunal Superior Eleitoral comemorou a média nacional deste ano. Para o presidente do tribunal, Luís Roberto Barroso, o número poderia ser maior por causa da pandemia. “Extraordinário porque nas últimas eleições (2018) foi mais de 20% e nesta eleição, 23%, em meio a uma pandemia. Mais um fator que precisamos comemorar”.
Goiânia (GO), com 30,72%; Curitiba (PR), 30,18%; e São Paulo (SP), 29,29%, fecham a lista das cinco capitais com maior abstenção em 2020. Recife (PE), com 19,89%, e Manaus (AM), com 18,23%, foram as que registraram o menor índice.
A pandemia é apontada como principal motivo. O engenheiro civil George Rolemberg, de 27 anos, entrou para a estatística. Eleitor em Natal, ele apresentou sintomas da covid-19 na terça-feira anterior às eleições, após ter contato com uma pessoa que testou positivo para a doença. “Eu vi a indicação do TSE que dizia que quem estivesse com suspeita de covid era melhor ficar em casa, para evitar a transmissão para outras pessoas”, disse. Ele justificou a ausência pelo aplicativo e-Título nesta segunda.
Para o cientista político Rodrigo Prando, professor da Universidade Mackenzie, a pandemia teve um peso decisivo para o aumento na abstenção no primeiro turno, mas não é o único fator. “Ver esse aumento de abstenção de mais de cinco pontos entre 2016 e 2020, com pandemia, não me surpreende. Com esse cenário (de pandemia), eu acreditava que a essa taxa pudesse ser maior ainda”, disse. “Se estivéssemos no início da pandemia, na ‘subida da curva’, eu creio que a abstenção teria sido muito maior. Estamos há quase um ano lidando com a pandemia: usando máscara, álcool em gel, fazendo distanciamento”, avalia.
Sem votar
Neste ano, até candidatos engrossaram a expectativa da abstenção por causa da pandemia. Candidata a prefeita de Belo Horizonte, Áurea Carolina (PSOL) não foi votar porque está com covid-19. Ela testou positivo para a doença na véspera da votação. Apresentou sintomas leves e, nas redes, desabafou: “Infelizmente não poderei votar amanhã. Estou chateada, mas esperançosa”. Na capital mineira, o prefeito Alexandre Kalil (PSD) foi reeleito no primeiro turno 63% dos votos válidos. Áurea ficou em quarto lugar, com 8,31%.
Em Goiânia, o candidato a prefeito Maguito Vilela (MDB) também não pôde votar por estar com covid-19. Internado, ele precisou ser entubado no dia da votação por causa de uma nova inflamação nos pulmões. Nas redes sociais, o candidato reclamou de “fake news” sobre seu estado de saúde, que estariam sendo espalhadas pela internet. “Há quem use os piores artifícios da velha política para desinformar”. Maguito disputará o segundo turno com Vanderlan Cardoso (PSD).
Rodrigo Prando aponta que os pleitos anteriores, de 2012, 2016 e 2018, já demonstravam o aumento da abstenção – seguindo uma tendência global. “Se observarmos o aumento da abstenção nas últimas votações, fica claro como a população está cansada da política. É um movimento que existe não apenas no Brasil, mas que está sendo discutido no mundo todo como uma crise da democracia representativa.”
Viagens
Como em todos os anos, outros fatores, como viagens, são apontados para justificar a ausência na hora do voto. A universitária Érika Santos, de 21 anos, também não compareceu às urnas no dia da votação. Com o avanço da pandemia em São Paulo e a digitalização das aulas e do trabalho, ainda em março, ela e o namorado resolveram passar a quarentena na casa dos pais dele, no Rio Grande do Norte. Ela diz que também não pretende votar no segundo turno. “Eu ainda estarei fora de São Paulo, mas mesmo que estivesse, não sei se me arriscaria, principalmente depois das denúncias de aglomeração nos locais de votação”, disse.
Ruy Francisco Silva de Almeida, 31, trabalha com desenvolvimento de software e se mudou com a mulher para Lisboa, em Portugal, em dezembro de 2019. Por estar fora do Brasil, ele utilizou o e-Título para justificar sua ausência. Relatou instabilidade no aplicativo. “Achei bem simples de usar o aplicativo e não tive problema algum com login. Minha esposa, ao justificar o voto, o app parecia não ter efetivado a justificativa. Ao tentar novamente, o app informava que uma justificativa já havia sido feita. Funcionou, mas houve uma instabilidade.”
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