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Economia e Negócios

PEC do auxílio emergencial cria nova regra com limite para a dívida pública

Lei complementar vai definir meta para a relação dívida-PIB. Hoje, porcentual está em 89,7% e países emergentes com grau de investimento têm taxa média de 51%.

A dívida pública passará a ser a principal âncora da política fiscal brasileira para garantir a sustentabilidade e enfrentamento do rombo das contas públicas. A introdução de uma meta para a dívida pública no arcabouço das regras fiscais do País foi incluída na Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do auxílio emergencial, promulgada esta semana pelo Congresso.

Para garantir a sustentabilidade fiscal, a emenda prevê a necessidade de definição de uma trajetória de convergência do montante da dívida com os limites a serem definidos. O texto autoriza medidas de ajuste para as contas públicas alcançarem a trajetória desejada e o planejamento de alienação de ativos para a redução da dívida, como é o caso das privatizações de empresas e venda de imóveis.


A medida, que alcança as finanças do governo federal, Estados e municípios, pode colocar o Brasil numa nova geração de regras fiscais que já é adotada em vários países, na avaliação da equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes.

A ideia é que a dívida passe a ser o principal “termômetro” fiscal e ajude também a aumentar a potência da política de juros do Banco Central, garantindo maior previsibilidade para o endividamento público.

Para entrar em vigor, uma lei complementar precisa ainda ser aprovada com a regulamentação dos mecanismos de funcionamento da nova âncora, apontando uma trajetória para o alcance da dívida em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). A ideia do Ministério da Economia é não demorar com o envio do projeto ao Congresso.

A própria emenda diz que a lei complementar pode autorizar a aplicação dos mesmos gatilhos (medidas de corte de despesas) já previstos, como o congelamento de salários dos servidores.

A nova âncora vai conviver e se interligar com as outras três regras fiscais: teto de gastos, meta de resultado primário e a regra de ouro. O teto limita o crescimento das despesas à variação da inflação; a meta de resultado primário é a diferença entre receitas e despesas, menos o pagamento de juros. Já a regra de ouro impede que o governo se endivide para pagar gastos correntes, como salários e custeio da máquina.

O secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, disse ao Estadão que a aprovação da PEC garantiu um arcabouço para o controle das contas públicas melhor do que havia antes. Rodrigues listou 12 medidas (veja abaixo) que formam a “espinha dorsal” do reforço fiscal da nova emenda constitucional, que inclui também medidas que desarmam “bombas fiscais” para o futuro.

'Conversa de regras'

As atuais três regras vão ter de conversar tendo como referencial a dívida pública, explicou o secretário. Segundo ele, a lei complementar é que vai definir os parâmetros de como a ancoragem da dívida será feita. Hoje, a dívida bruta do governo está em 89,7% do PIB (o último dado disponível é de janeiro). Qual o parâmetro para que a torne sustentável e a sua trajetória são o que a regulamentação vai detalhar.

“Um indicador que temos é o nível médio do endividamento hoje que é da ordem de 51% dos países emergentes que têm grau de investimento”, disse. No melhor momento da série do Banco Central, em dezembro de 2013, a dívida pública brasileira chegou a 51,5% do PIB.

Entre os parâmetros para definir a meta de endividamento está o tamanho que o caixa do Tesouro tem de ter para assegurar a confiabilidade na gestão da dívida.

“A nova âncora traz para o Brasil o que há de melhor em práticas de regra fiscal que existe no mundo e recomendadas também pelo Fundo Monetário Internacional (FMI)”, afirmou Daniel Borges, diretor de programa do Ministério da Economia, que trabalhou na elaboração da proposta.

Borges explicou que hoje o governo calcula a meta de resultado primário com o “insumo” do teto de gastos para depois fazer as projeções de dívida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). A dívida está no final da linha. O que se quer é inverter esse processo. Nada muda, segundo ele, na meta fiscal e no teto de gastos. Já a regra de ouro deve ser aprimorada na regulamentação da nova meta de dívida, antecipou o secretário Waldery Rodrigues.

O coordenador-geral de estudos econômico-fiscais do Tesouro, Rafael Araújo, compara a nova âncora a um instrumento de controle do nível de endividamento equivalente ao que faz o regime de meta de inflação dando clareza para a trajetória futura. O governo define um parâmetro para a alta dos preços e o Banco Central calibra os juros para alcançá-lo.

Ex-secretário do Tesouro, Carlos Kawall disse que medida incluída segue estudo feito pela equipe do Tesouro para evoluir para uma regra que combine superávit primário com meta de dívida/PIB. “Acho positivo e me parece que a ideia é evoluir nessa direção pós-teto de gastos. Mas não vejo mudança no curto prazo”, disse o atual diretor do Asa Investments. Para ele, a medida depende da lei complementar e não vai avançar antes da eleição.

Coordenador do Observatório Fiscal do Ibre-FGV, Manoel Pires, diz que a previsão de limite de dívida já existe na Lei de Responsabilidade Fiscal e nunca avançou: “O governo está tentando dar uma renovada nesse debate para ver se consegue avançar para aprovar uma legislação mais completa”. Para ele, é preciso acompanhar no detalhe a regulamentação.

Ganhos fiscais

Principais medidas de reforço fiscal e desarmamento de bombas para o controle das contas.

Precatórios

Fim da linha de crédito de R$ 117 bilhões que a União teria de bancar para Estados e municípios pagarem precatórios (valores devidos a pessoas físicas ou empresas após sentença definitiva na Justiça).

Lei Kandir

Garante segurança jurídica ao fim da compensação aos Estados da Lei Kandir, que desonerou as exportações do ICMS.

Calamidade pública

Estabelece competência privativa ao presidente da República de propor ao Congresso a decretação de calamidade pública de âmbito nacional. O Congresso não poderá mais fazer de forma unilateral.

Fundos

Possibilidade de utilização do superávit financeiro dos fundos, por três anos, para pagamento de dívida. Um valor superior a R$ 100 bilhões que vai ajudar na gestão da dívida.

Gatilhos

Regulamenta o acionamento dos gatilhos do teto de gastos (regra constitucional que impede que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação) pelo governo federal.

Âncora

Inclusão de novo arcabouço fiscal À dívida como sua principal âncora.

Políticas públicas

Previsão constitucional de avaliação dos programas de políticas públicas, como por exemplo, o Bolsa Família. O Orçamento terá de levar em conta a avaliação.

Despesas x receitas

Permite que os chefes dos Estados e municípios acionem automaticamente gatilhos (medidas de cortes de gastos) quando as despesas correntes ultrapassem 95% das receitas correntes.

Maquiagem fiscal

Inclusão expressa de despesas com pensionistas no limite de despesas de pessoal acabando com maquiagem contábil nas contas dos Estados e municípios para evitar o estouro do limite.

Medidas de ajuste

Proíbe a concessão de empréstimos e garantias para Estados e municípios que não adotem medidas de ajustes durante a calamidade nacional.

Repasses duodecimais

Veda a transferência para fundos dos repasses duodecimais ( fatias da receita prevista no Orçamento que são repassadas mensalmente, sem prejuízo) dos demais Poderes. O superávit desses fundos é restituído ao Tesouro. A medida evita que esses fundos de Legislativo e Judiciário tenham sobra de dinheiro enquanto o Executivo passa por dificuldades.

Tributos

Plano de redução gradual dos incentivos e benefícios de natureza tributária (subsídios, isenções e desonerações) para 2% do PIB em 8 anos (o patamar atual é de aproximadamente 4,2% do PIB).

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