A Procuradoria Geral do Estado do Piauí ingressou no Tribunal de Justiça com pedido de suspensão imediata, com efeito retroativo, da liminar que concedeu o direito de 19 alunos do 5° e 6° anos do curso de Medicina da Universidade Estadual do Piauí (UESPI) se formarem, antes do previsto, para se inscreverem no Programa Mais Médicos devido a pandemia do coronavírus (covid-19).
Na petição protocolada ontem, às 17h34min, a PGE argumenta que com o início da pandemia da Covid-19, diversos estudantes de Medicina da UESPI que estavam na fase de internato (5º e 6º anos do curso) deixaram voluntariamente de comparecer ao estágio acadêmico-profissional hospitalar.
- Foto: Divulgação AscomAlunos do curso de Medicina colam grau na Uespi para combater a Covid-19
Narra que, de acordo com abaixo assinado entregue pelo Centro Acadêmico à Direção do Curso, os alunos afirmaram que ainda não eram médicos e que não se sentiam preparados para cuidar dos pacientes durante a crise do Covid-19.
Para a PGE, “na hora de maior necessidade para a sociedade brasileira, os estudantes de medicina dos últimos anos se recusaram a cumprir seu dever de ofício”.
Frisa que, ao abandonar voluntariamente o internato, os alunos necessariamente teriam que adiar as suas formaturas, até que tivessem completado todos os ciclos obrigatórios dos 02 (dois) anos de internato, exigidos para a graduação.
A PGE argumenta que apesar de terem voluntariamente abandonado o internato, o grupo de estudantes resolveu pedir que o Poder Judiciário “lhes garanta o direito de formatura antecipada anômala, independentemente da concordância da Universidade, e de se inscrever no CRM, mesmo sem a finalização do curso”.
“Alegam - agora - que já são médicos com formação plena, que desejam ardentemente combater a pandemia da Covid-19, e que pretendem, com isso, apenas perseguir o interesse público trabalhando no Programa Mais Médicos. Por esse motivo, prosseguem, devem ter o direito de obter a formatura antecipada, à qual a Universidade se opõe por mero formalismo e burocracia, sem qualquer razão objetiva”, diz a petição.
Segundo a PGE, os estudantes pedem a formatura antecipada porque se recusaram a prosseguir trabalhando regularmente no internato em razão da Covid-19, por razões que, inclusive, põem em cheque as “nobres motivações” alegadas.
“Na verdade, os estudantes autores não têm, ainda, direito a se formarem no curso de medicina pela simples razão de que ainda não concluíram o currículo mínimo necessário para o exercício desse ofício com segurança para os pacientes”, destaca.
De acordo com a petição, conceder as prerrogativas de médicos formados a estudantes que ainda não completaram o treinamento mínimo necessário significa pôr em risco a vida de dezenas ou centenas de pacientes, que terão que se submeter a tratamentos por profissionais sem comprovação do mínimo conhecimento necessário, às vezes em momentos de grande risco a sua existência, inclusive em razão da pandemia da Covid-19.
O pedido de suspensão de liminar será apreciado pelo presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Sebastião Ribeiro Martins.
Comunicação de suspensão voluntária de estágio
Entenda o caso
A juíza Carmelita Angélica Lacerda Brito de Oliveira, da 2ª Vara dos Feitos da Fazenda Pública da Comarca de Teresina, concedeu o direito de 19 alunos do 5° e 6° anos do curso de Medicina da Universidade Estadual do Piauí (UESPI) a se formarem antes do previsto para se inscreverem no Programa Mais Médicos devido a pandemia do coronavírus (Covid-19).
A decisão foi dada no último dia 20 de março após os estudantes e advogados entrarem na Justiça com uma petição pedindo o direito ao diploma pela instituição. Após o deferimento do pedido pela magistrada, os oficiais de Justiça até o momento não conseguiram localizar o reitor da Uespi, Nouga Cardoso, para reconhecer o direito e providenciar os diplomas.
Na decisão, a juíza destacou que mesmo a Uespi possuindo autonomia, é necessário que os alunos se formem por conta da necessidade e da situação do covid-19.
“Embora a Constituição consagre a autonomia das Universidade, no presente estado de coisas, há que se relativizar esta autonomia, em função das consequências epidemiológicas causadas pelas doenças respiratórias do coronavírus. O indeferimento da colação de grau antecipada não se mostra proporcional ante a necessidade de profissionais da saúde aptos para atender e orientar os casos mais leves da doença”, ressaltou .
Outro ponto da decisão, é o fato de que com novos médicos atuando no combate do coronavírus, seriam dispensados os profissionais que se encontram no grupo de risco, como médicos acima de 60 anos.
“De fato, o deferimento da colação de grau antecipada aos requerentes, é apta a promover o bem público, consubstanciado na saúde coletiva. Há necessidade da medida (colação de grau antecipada), em razão da situação ímpar em que o país está vivendo, contratando novos profissionais e dispensando de plantões e serviços públicos os médicos com mais de 60 anos, havendo, portanto, déficit de profissionais da área. Indubitável que a antecipação da colação de grau é proporcional em sentido estrito, porque visa à promoção do bem maior, saúde pública, em detrimento da formal autonomia garantida à Universidade”, destacou.
Outro lado
Em nota, os egressos da XXXII turma de Medicina da Universidade Estadual do Piauí repudiaram os argumentos utilizados pela Uespi e afirmaram que nenhum dos estudantes se ausentou de suas atividades sem alguma razão.
Confira a nota na íntegra:
Os egressos da XXXII turma de Medicina da Universidade Estadual do Piauí vêm declarar seu repúdio aos argumentos utilizados pela UESPI descritos na matéria em questão
1. Inicialmente, para que não haja nenhum tipo de deturpação de informações é preciso deixar claro que todos os egressos eram alunos do 12º período do curso de Medicina e que, portanto, nenhum aluno do 5º ano (9º e 10º períodos) ou mesmo do 11º período solicitou adiantamento de formatura
2. A 32ª turma esclarece, ainda, que nenhum dos estudantes se ausentou das suas atividades do internato sem razões. Isto tão somente aconteceu em ciclos onde os preceptores e coordenadores optaram pelo cancelamento das atividades em decorrência da pandemia de COVID-19 (tal fato aconteceu, por exemplo, nos ciclos de neonatologia, cirurgia geral e em ciclos onde o aprendizado era prioritariamente feito em ambientes ambulatoriais onde todas as atividades do HGV, o hospital escola da instituição, foram suspensas).
3. No entanto, reiteramos que não só como estudantes mas também como Médicos não admitimos a exposição a condições de trabalho inseguras. E tal fato vinha sendo uma constante em muitos hospitais. Os estudantes , por vezes, não tiveram disponibilizados os Equipamentos de Proteção Individuais (EPIs) mínimos necessários para o exercício de suas atividades com segurança(faltavam máscaras, aventais, toucas, óculos e outros equipamentos)
4. Reiteramos nosso posicionamento de que nenhum profissional de saúde deve, portanto, se submeter a situações de trabalho indignas. Ademais, não houve nenhum esclarecimento por parte da instituição acerca de garantia de Seguro Saúde aos estudantes possivelmente acometidos pelo novo vírus que se alastra em nossa cidade, estado e país, provocando inúmeras hospitalizações e óbitos diários.
5. Esclarecemos ainda que o Centro Académico é representante direto de todos os estudantes de Medicina do curso mas que suas decisões são sempre tomadas por meio de discussões e votações onde a opinião da maioria é acatada, não sendo portanto um pensamento unânime embora deva ser respeitosamente aceito mesmo pelos que possuem opinião distinta . Portanto é inverídico e sensacionalista extrapolar os argumentos do documento emitido pelo Centro Academico a todos os egressos do curso.
6. Ademais, as motivações para suspensão voluntária do internato já foram acima supracitadas e envolviam as péssimas condições de segurança e também recomendações de órgãos e autoridades competentes. Além disso, de todas as instituições com cursos de Medicina de Teresina, a Universidade Estadual foi a única que optou pela manutenção das atividades ordinárias do internato, não se pondo aberta a diálogo e nem sequer pensando nas condições de segurança a que seus estudantes estariam submetidos, o que mostra um completo descaso e um interesse claro em mão de obra barata para “tocar serviço”.
7. Esclarecemos ainda que, diferente do exposto pela instituição, todos os egressos apresentavam carga horária superior à carga horária mínima exigida pelo Ministério da Educação para o curso de Medicina que é de 7200h (todos os alunos já haviam integralizado mais de 8000horas)
8. Reafirmamos ainda, nosso compromisso e completa dedicação para com o exercício da Medicina da forma mais correta e humana possível. Em meio a tantas questões envolvendo saúde pública no mundo, é inadmissível que a Uespi se utilize de argumentos sensacionalistas, inadequados e desrespeitosos para invalidar nossa capacidade de atuação no enfrentamento à essa pandemia pondo em cheque a própria formação e o profissionalismo dos médicos que a instituição coloca no mercado de trabalho. Ao contrário do que a instituição sugere, acreditamos piamente no trabalho realizado e na formação que nos foi dada, considerando esta suficiente para o exercício da profissão, sempre da forma mais correta, humana e humilde possível.
9. Por fim, lamentamos profundamente a postura de desrespeito desta instituição, que foi nossa casa por quase 6 anos e pela qual nutrimos completo sentimento de respeito. É doloroso que tenhamos nosso caráter e nossa ética postos em cheque através de argumentação completamente infundada e sensacionalista.
Nos colocamos cordialmente a disposição para esclarecimento de quaisquer dúvidas
Atenciosamente
Egressos da XXXII turma de Medicina da Universidade Estadual do Piauí
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