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Nuvens de poeira avançam em 5 Estados e são alerta para extremo climático

Fenômeno registrado em São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Maranhão exige ações locais.

Com proporções distintas, tempestade de terra e poeira como as registradas em São Paulo e em Estados como Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Maranhão nos últimos dias demonstram a necessidade de ações para conter os extremos climáticos. A mudança exige tanto ações locais, como de mudança nas formas de cultivo na agricultura, quanto de maior abrangência, como o fim do desmatamento da Amazônia.

Estudos como o relatório do IPCC deste ano já haviam demonstrado que episódios como estes se tornaram cada vez mais frequentes e evidentes, e que o momento de mudar é agora. Embora tempestades como estas (chamadas também de haboob) sejam registradas em períodos de seca de forma pontual todos os anos, alguns casos recentes, como da região de Franca e Ribeirão Preto, chamaram a atenção pela proporção, força e frequência.


Professor do Departamento de Biologia da USP de Ribeirão Preto, Marcelo Pereira explica que os registros do fenômeno estão relacionados tanto a fatores locais quanto de âmbito mais amplo. Um dos principais é a devastação recorde da Amazônia, cuja evapotranspiração (umidade liberada no ambiente pelas árvores) regula o regime de chuvas de outras partes do País, como a região sudeste.

“A umidade é transportada pelos ventos em direção ao Oceano Pacífico, mas, como tem a Cordilheira dos Andes no meio do caminho, acaba sendo rebatida para o Sul e o Sudeste. E são essas massas de ar que regulam as nossas chuvas”, comenta.

“Não podemos esquecer que são fenômenos que ocorrem distantes, mas que estão muito ligados. Se a Floresta Amazônica continuar sofrendo, vai ficar cada vez mais irregular (o cenário de chuvas), e a tendência é ficar cada vez mais seco”, diz. “Deixar a Amazônia ter problemas de desmatamento é assinar atestado de óbito pra gente.”

Por outro lado, há também as questões locais. Um exemplo que o professor cita são as queimadas registradas em regiões atingidas pelo fenômeno deixaram fuligem e vegetação destruída, cujas partículas entraram em suspensão com a força dos ventos, espalhando um material prejudicial à saúde. “Precisa haver uma preparação para combater de forma mais eficiente. Senão, as áreas vão ficar cada vez mais desprotegidas.”

As tempestades de areia registradas são, portanto, resultado dessa situação aliada ao calor extremo, a secura e os fortes ventos. “A massa de ar frio e úmido se encontra com a de ar quente e seco. O ar úmido é mais denso e tende a ir para baixo, enquanto o ar seco tende a ir para cima. Quando isso acontece, há a movimentação das massas, as frentes de rajada. Quanto maior a diferença de temperatura entre as duas massas, mais fortes vão essas rajadas (de vento)”, explica.

Ele destaca que esse tipo de situação acontece em determinadas situações nesta época do ano, mas que não com tanta frequência e intensidade como foi a do penúltimo domingo, por exemplo. “É um mau sinal. Existem ciclos de secas mais intensas, mas estes períodos estão cada vez mais secos e maiores, e o período de chuvas cada vez menos frequente. É indicativo de uma coisa maior.”

Por isso, são importantes iniciativas de recuperação, porém os resultados nem sempre serão um retorno exatamente ao que era antes. “Danos muito grandes, às vezes não dá para compensar.”

Professora do Departamento de Ecologia da UnB, Mercedes Bustamante explica que o impacto das rajadas de vento também afetam ainda mais o solo já castigado pela seca, pois remove as camadas mais superficiais, onde está a maior riqueza de nutrientes (inclusive os agrícolas) e microorganismos. “Aquela nuvem (em Franca, por exemplo) é o latossolo de coloração avermelhada da região.”

Para evitar que estes nutrientes sejam perdidos, é necessário haver cobertura vegetal. Porém, a que é feita nas propriedades, quando ocorre, acabou sendo em parte destruída pelas queimadas, restando apenas o solo exposto – também revirado em outros locais por processos anteriores à semeadura.

A docente destaca, portanto, que é preciso investir no desenvolvimento de novas formas de cobertura vegetal, que estejam prontas para ocorrências de rajadas fortes. Além disso, a recuperação de áreas degradadas também se impõem essencial, tanto por “quebrarem” a força do vento quanto na recuperação da biodiversidade local. “A conservação produz a proteção do solo. E não tem agricultura se não tiver conservação.”

Neste aspecto, destaca que a monocultura vista ainda no País (e inclusive em parte das regiões atingidas, seja de cana-de-açúcar, de soja ou de milho) não é mais viável em um contexto de mudanças climáticas. “As condições estão mudando”, comenta.

Isto implica na diversificação dos cultivos, com variedades com diferentes respostas ao “estresse hídrico”. “Essa agricultura do mar de cana, do mar de soja, do mar de milho, tem que ficar no passado, não corresponde às questões ambientais”, comenta. Um exemplo é uma estimativa da ONU, de 2019, de que, a cada 5 segundos, o mundo perde uma quantidade de solo equivalente a um campo de futebol e que, neste ritmo, mais de 90% de todos os solos do planeta podem ser degradados até 2050.

A pesquisadora lembra, ainda, que um degradado também está mais suscetível a problemas com as chuvas, especialmente com a erosão hídrica. “Se não consegue que a cobertura vegetal volte rapidamente, corre-se o risco da erosão que vem com a água, o que também preocupa um pouco.”

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