Na “Oração aos Moços” escrita pelo jurista Rui Barbosa em 1921, ele assim manifestou-se acerca do papel do magistrado e a missão do advogado: "Justiça tardia não é justiça; senão injustiça qualificada e manifesta". O texto foi lido na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo, onde o jurista não pode comparecer como paraninfo da turma de Direito de 1920, devido a problemas de saúde, e o professor Reinaldo Porchat leu o texto para os formandos.

A morosidade na prestação jurisdicional provavelmente é a maior mácula da Justiça brasileira, o que lamentavelmente tem sido uma regra Brasil afora. Trarei aqui ao conhecimento dos caros leitores e caríssimas leitoras casos emblemáticos de processos que tramitam por anos, até dezenas, sem a efetiva solução do conflito.

Foto: JACINTO TELES
Sede principal do STF na Praça dos Três Poderes em Brasília; vista a partir da área dos Anexos

No Supremo Tribunal Federal, por exemplo, há “pedidos de vistas” de ministros que duram anos, obviamente que essas e outras formas de morosidade na Suprema Corte serão, oportunamente, registradas aqui, inclusive, críticas bem fundamentadas de constitucionalistas renomados, a exemplo de Virgílio Afonso da Silva que vem fazendo um debate bastante pertinente sobre o tema. Por outro lado, trarei também casos importantes julgados e resolvidos no STF, com razoável duração do processo, bem como em outros tribunais do País.

Nesta ocasião destaco dois casos semelhantes no STF, ambos os ministros-relatores adotaram o "rito abreviado" previsto na lei que regula a ação direta de inconstitucionalidade, o que vem a ser o 'rito de celeridade'. Em um dos casos o processo foi julgado e a prestação jurisdicional disponibilizada, no outro a morosidade prospera. E o que é dificl de se entender é que o processo que não foi julgado chegou à Suprema Corte antes do que já transitou em julgado.

Nunes Marques, ministro do STF, vota em ADI do Maranhão e em caso idêntico que atua como relator protela julgamento em relação a Goiás

Trago esses dois casos emblemáticos junto ao STF: um do Maranhão (ADI 7098) e outro de Goiás (ADI 7069), no primeiro, sob a relatoria o ministro Gilmar Mendes, o eminente ministro piauiense Kassio Nunes Marques apresentou voto vogal a favor do pedido de inconstitucionalidade, já no segundo em que Nunes atua como ministro-relator na ADI nº 7.069 – Goiás , mesmo esta tendo sido ajuizada antes da ADI 7.098 do Maranhão , até o momento Nunes não apresentou pedido de pauta ao Ministro-presidente Roberto Barroso.

Escolhi tais casos, para sobre estes discorrer, por ter conhecimento de causa, pois atuo em ambos os processos como advogado sócio da JK Advocacia & Consultoria Especializada em nome da entidade nacional dos policiais penais do Brasil (AGEPPEN), a qual opera no controle concentrado de constitucionalidade na Suprema Corte.

Foto: Antônio Augusto/STF
Nunes Marques vota pela inconstitucionalidade de lei maranhense, mas em assunto semelhante na ADI 7069 de Goiás em que é relator não se manifesta; embora tenha adotado o rito de celeridade do art. 12, da Lei que regula a ADI o processo está há anos sem julgamento, não obstante já ter parecer favorável da PGR.

No caso da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 7.098-MA), em face do governador do Estado e da Assembleia Legislativa do Maranhão, ajuizada no Supremo em 15 de março de 2022, que teve como relator o ministro Gilmar Mendes, que, inclusive, adotou o "rito abreviado", isto é, rito célere, previsto no Art. 12, da Lei 9.868/99 que dispõe sobre o processo e julgamento da ação direta de inconstitucionalidade.

Nesse caso foi pedida a inconstitucionalidade de dispositivos da Lei nº 10.678, de 13 de setembro de 2017, que permitia a contratação de servidores penitenciários tanto da área da segurança prisional [burlando as funções dos policiais penais] como na do pessoal da assistência da Execução Penal, a exemplo de pedagogos, psicólogos, médicos, odontólogos, enfermeiros, auxiliares penais, dentre outros sendo julgada no Plenário Virtual de 17 a 24 de março de 2023, sendo que o prazo de realização dos concurso finda em março de 2025, sob pena de responsabilidade do governador do estado.

Foto: Gustavo Moreno/SCO/STF
Ministro Gilmar Mendes foi Relator da ADI 7.098 do Maranhão, cujo julgamento se deu de forma célere fazendo jus ao rito do art. 12 da Lei de ADI.

Ao final o julgamento fora proferido por maioria, tendo apenas o voto contrário em parte do grande constitucionalista Roberto Barroso [que atualmente preside o STF], o resultado foi para declarar a inconstitucionalidade da lei que permitia os contratos temporários sendo concedida a modulação dos efeitos em 2 anos, ou seja, tempo para o Estado do Maranhão, por meio do seu governo realizar e dar posse a mais de 4 mil profissionais policiais penais e demais servidores especializados no sistema prisional, fato que incomodou o atual governador Carlos Brandão, levando-o a interpor recurso de embargos declaratórios. Todavia, o ministro-relator Gilmar Mendes ratificou o julgamento anterior mantendo o mesmo prazo de 2 anos para o cumprimento integral da Decisão, no que foi seguido por todos os ministros e ministras [ainda estava na Corte a então ministra Rosa Weber que antecipou seu voto] e acompanhou o relator.

Em Goiás há centenas de aprovados no concurso de Policiais Penais de 2019, bem como deste ano de 2024, que devem ser beneficiados com a possível e imprescindível decisão do colendo Supremo Tribunal Federal na ADI 7.069-GO.

Foto: Valter Camargo/Agência Brasil
Ronaldo Caiado descumpre a Constituição da República em relação à Polícia Penal sob o olhar silente do Supremo Tribunal Federal.

São profissionais que tiveram de abandonar outras carreiras profissionais para se prepararem para realizar um sonho de poder ser policial penal da Polícia Penal de Goiás; que, aliás, numa medida paradoxal o governador Ronaldo Caiado ao tempo em foi o 1º chefe do Executivo a nomear o diretor-geral da Policia Penal, cargo regulamentado legalmente em medida compatível com a Emenda Constitucional 104/2019, que criou a Polícia Penal no âmbito na União, dos Estados e do Distrito Federal, mantém mais de dois mil vigilantes penitenciários em atividades indelegáveis de policiais penais. Tal medida só ocorre porque o STF ainda não julgou a Ação Direta de Inconstitucionalidade que requer a declaração de inconstitucionalida da Lei nº 20.918/2020 e do Decreto nº 9.812/2021 de Goiás que permitem essa anomalia.

Essa realidade fragiliza a atividade policial penal e cria faixas salarias muito díspares, pois, enquanto o policial penal percebe remuneração de algo em torno de R$ 6 mil o servidor temporário ganha menos de R$ 2 mil, isso pode contribuir para outras ilegalidades no sistema prisional.

Mais de 54 mil pessoas participaram do concurso de 2019, isso se deve ao fato de que paralelamente o Estado de Goiás lançou edital de processo seletivo para 2554 vigilantes penitenciários temporários. Tal ato contraria violentamente a Emenda Constitucional 104/2019, o que causou um enorme litígio e desespero à aqueles 424 candidatos que ficaram remanescentes e preteridos em razão da convocação dos temporários ter sido admitidos em caráter precário.

Foto: JACINTO TELES
Sede da PGR em Brasília de onde originou o Parecer pela Inonstitucionalidade da Lei de Goiás que permite contratação temporária na Polícia Penal

A mora judicial nesse caso, refletiu nos sonhos, na saúde e até causando incredulidade do Judiciário, pois não coibir um ato inconstitucional e reparar seus danos, abre margem para que o órgão Estatal pratique à revelia seus atos irregulares que, pela morosidade da Justiça termina por interromper sonhos de cidadãos que acreditaram nas intituições democráticas e agora se sentem agredidos no que lhes restam de mais sagrado: a dignidade.

É importante que fique claro que o Ministro-relator, Nunes Marques há mais de 2 anos já recebeu o Parecer favorável à tese defendida pela JK Advocacia & Consultoria Especializada [que é irrefutavelmente a tese do cumprimento da Constituição cidadã de Ulisses Guimarães] emitido pela Procuradoria-Geral da República, cujo titular ainda era o PGR Augusto Aras.

Clique aqui e confira o Parecer do PGR.

*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1