Nas três primeiras semanas de abril, o Brasil já teve o seu melhor desempenho na imunização contra a covid-19 desde que a vacinação começou, chegando a uma média superior a 740 mil doses aplicadas por dia, quase o dobro do mesmo período no mês anterior. Também, também chegou a ultrapassar a marca de 1 milhão de vacinas administradas em 24 horas, repetindo o feito outras quatro vezes, a última delas na segunda-feira, 19. Apesar da melhora no ritmo, no entanto, o volume está aquém da capacidade diária de 2 milhões do Plano Nacionaesl de Imunização (PNI), e o principal empecilho para que essa aceleração aconteça é a falta de imunizantes disponíveis, que atrasa as campanhas em Estados e municípios de todo o País.
O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, já disse que a meta é imunizar pelo menos um milhão de pessoas por dia. "Vacina aqui acaba antes da hora", conta Fábio Villas-Boas, secretário estadual da Saúde da Bahia, que já aplicou a primeira dose em 13,83% da sua população, o segundo melhor desempenho no País e acima da média nacional, de 12,59%. "Só não estamos vacinando mais porque não temos mais vacinas." Na campanha nacional, mais de 80% das doses usadas têm sido da Coronavac, do Instituto Butantan e da chinesa Sinovac, e o restante é Oxford/AstraZeneca, cuja produção no Brasil fica a cargo da Fiocruz.
Há um mês, a Secretaria de Saúde da Bahia decidiu repassar novas doses da vacina apenas aos municípios que já tivessem utilizado 70% do estoque anterior. Quinze dias depois, a porcentagem obrigatória subiu para 85%. "Foi uma confusão e vários municípios reclamaram, mas todos se adequaram", conta Villas-Boas.
Para melhorar a eficiência na administração das doses, municípios que antes tinham utilizado de 50% a 60% das vacinas entregues investiram na contratação de novos aplicadores e funcionários responsáveis pela inserção dos dados no sistema eletrônico de controle. O ritmo acelerou e, no início de abril, a Bahia já era o Estado com maior proporção de imunizados no País. Desde então, as remessas se esgotam antes da entrega seguinte.
Ocupando hoje o topo da lista de imunizações, com 17,39% da população com ao menos a 1ª dose recebida, o Rio Grande do Sul adotou estratégia similar à da Bahia, com o lema "O RS estoca vacina no braço". Para a secretária estadual da Saúde, Arita Bergmann, o avanço é fruto de uma pré-organização do Estado e da celeridade na distribuição aos municípios.
"Fazemos esse trabalho entre receber e organizar a distribuição no Estado em menos de 24 horas. Isso é fundamental. Os municípios mais distantes recebem de transporte aéreo e, os mais próximos, por via terrestre", explica Arita, que afirma repassar os estoques recebidos do PNI para distribuição em menos de quatro horas. "A capilaridade dos pontos de vacinação na rede municipal é muito robusta", garante
Ela cita o exemplo de Camaquã, município a 127 quilômetros dr Porto Alegre, onde a distribuição da vacina nos 31 pontos de aplicação é feita simultaneamente por 14 veículos. "Primamos por não ter vacina armazenada. Boa vacina é aquela que foi aplicada", aponta Arita, que hoje precisa driblar também atrasos pontuais na entrega pelo PNI e o quantitativo aquém da capacidade de imunização. "A gente está sempre com o coração na mão. Queremos que o ritmo seja constante e na batida do coração, mas às vezes dá uma freada."
Por outro lado, a maioria dos Estados nas regiões Norte e Centro-Oeste, exceto Amazonas e Mato Grosso do Sul, estão abaixo da média nacional. Na maioria deles, como em Mato Grosso, menos de 10% da população recebeu a 1ª dose da vacina.
Em nota enviada ao Estadão, a Secretaria Estadual de Saúde do Mato Grosso alega que o Estado recebeu doses "de acordo com o número de habitantes que integram os grupos de risco contemplados pelo PNI até o momento" e que tem "menos idosos". "É evidente que o Estado também receberá um quantitativo menor nesta etapa de vacinação", afirma o texto. "O governo de Mato Grosso espera que o quantitativo que abrange os públicos mais jovens seja maior."
A nota também pede que a métrica de vacinação analisada seja com com base no número de doses encaminhadas aos grupos prioritários e não na população em geral, "situação que pode gerar discrepância na análise do percentual de vacinados". Conforme dados do consórcio de veículos imprensa feitos com base nas próprias secretarias estaduais de Saúde, das 703.810 doses encaminhadas ao Estado pelo PNI, 436.334 foram aplicadas até sexta-feira, aproximadamente 62%.
Descompasso é falta de unidade nacional
Especialistas ouvidos pelo Estadão apontam que o descompasso nacional na vacinação contra a covid está ligado à falta de diretriz nacional. "Nada é normal nesse negócio da covid, tanto que estão mudando até as faixas prioritárias. Não dá para comparar com outras. O que dá para afirmar é que o Brasil tem um conhecimento técnico importante sobre vacinação que outros países não têm, mas não está usando", afirma Ana Maria Malik, professora da FGV - SP e coordenadora do GVsaude.
Secretário executivo do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), Mauro Junqueira ainda frisa que o próprio PNI sempre teve desafios em regiões afastadas e interioranas. Nessa conta, entram fatores que vão desde a dificuldade de acesso como a demora no registro dos dados, que pode ser afetado até pela qualidade da internet.
"Na vacinação extra-muro, como em drive-thru, praças e qualquer local fora dos postos de saúde, a maioria não tem computador, então o registro é feito de forma manual, para depois ser digitalizado. Alguns municípios, de médio e grande porte, têm sistemas próprios, onde registram o saldo do dia e depois fazem a migração para o PNI. Essa integrabilidade, alguns fazem diariamente e outros fazem uma vez por semana", explica. "Tem um delay entre o que foi vacinado e o dado subir na base nacional."
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