A cidade de Teresina, capital do Piauí, conhecida anualmente por suas ondas de calor no período chamado B-R-Ó BRÓ e também pelas chuvas alarmantes no primeiro trimestre de cada ano, já sofre as consequências decorrentes das mudanças climáticas que afetam severamente a população teresinense e podem proporcionar um futuro de vivência insalubre. Um dos pontos principais para tamanhas modificações é o crescimento urbano desenfreado, sem uso de consciência ambiental que pense no bem-estar da sua população. Mas o que pode ser feito para combater essas mudanças climáticas? O que pode acontecer se essas ações não forem efetivadas?

Para entendermos melhor as mudanças climáticas e o que a cidade espera se nada for feito, precisamos primeiro saber o porquê Teresina possui essa ambiguidade, sendo uma parte do ano chuvosa e outra parte com calor intenso. O professor de Geografia da Universidade Estadual do Piauí e diretor de Prevenção e Mitigação da Secretaria de Estado de Defesa Civil, Werton Costa , explicou ao GP1 que a capital piauiense possui uma localização que tendencia ao clima tropical. Além disso, a cidade é mesopotâmica, pois se situa entre os rios Parnaíba e Poti, esse fator, que é considerado vantagem, contribui mais ainda para que a energia solar seja mantida, o que nos leva a sofrer com o calor.

Foto: Lucas Dias/GP1
Professor Werton Costa

“Quando pensamos em Teresina como uma cidade quente, temos que considerar as chamadas variáveis astronômicas. A localização da cidade é um exemplo disso. Ela está bem próxima da linha do Equador. Essa linha, que divide o planeta Terra em dois hemisférios, é o ponto de máxima iluminação. A Terra, em seu movimento orbital em torno do sol, recebe quantidades diferenciadas de energia para o extremo norte e para o extremo sul. Porém, qualquer cidade que estiver próxima dessa linha recebe quantidades extraordinárias de luz. Esse é o primeiro fator astronômico. Aí temos que considerar o fator altimétrico. Altura, altitude, cidade baixa, entre quarenta a setenta metros acima do nível do mar. Isso só favorece temperaturas elevadas. Outro fator muito importante, que aparentemente é visto como um benefício, é que Teresina é uma mesopotâmica, é uma cidade que está encravada entre dois rios, o grande Parnaíba e o Poti. Esse padrão de umidade faz com que a energia absorvida, a energia radiante, a energia do sol, se conserve por mais tempo sobre a cidade”, explicou o docente.

Teresina não é mais a cidade verde

O nome cidade verde por muito tempo foi usado para se referir a Teresina, título que foi dado pelo poeta maranhense Coelho Neto em 1899, quando a capital possuía grandes áreas com árvores, enormes vegetações e abundância de sombras. Porém, a ação humana ao longo de muitos anos, e crescimento horizontal (que devasta mais áreas verdes), nos fez repensar se temos mesmo uma cidade verde, ainda mais com o calor que só aumenta, ano após ano. Outro ponto desse crescimento horizontal é a expansão do asfalto, uma ação que proporciona mais calor, devido à absorção maior de raios solares.

“E o outro fator, que não tem nada a ver com a natureza, mas é produzido, infelizmente, pela ação do homem, é que Teresina perdeu boa parte da sua cobertura vegetal. Se foi reconhecida no final do século dezenove, século vinte como a cidade verde pelo Coelho Neto, isso praticamente está restrito a alguns bosques, alguns parques e praças. Teresina é uma cidade espraiada, é uma cidade que cresceu muito do ponto de vista horizontal com uma expansão brutal do concreto e do asfalto. O asfalto, visto como progresso, contribui para aumentar a temperatura da cidade. Então, como ela é uma cidade horizontal que se expandiu destruindo vegetação, perdemos aquela amenidade, aquele refresco, produzido pela presença das árvores. E Teresina precisa urgentemente repensar o seu planejamento urbano, repensar um plano de arborização efetivo que possa garantir o conforto térmico”, detalha Werton Costa.

Foto: Hélio Alef/GP1
Árvores foram destruídas na Praça Gentil Macedo

Período chuvoso em Teresina

O professor Werton Costa também destaca que as mudanças climáticas em Teresina afetaram a média histórica de chuva em Teresina, que oscilava entre 1200 a 1400 milímetros, o que é uma quantidade significativa de chuva. No entanto, a capital piauiense tem experimentado uma diminuição na quantidade de chuva, fazendo com que as temporadas de chuva ficassem mais irregulares e alguns meses que eram tradicionalmente chuvosos, como dezembro e abril, não estão mais recebendo tantos volumes pluviométricos. Além disso, a perda e irregularidade das chuvas resultam em volumes de água mais intensos e extremos, o que se torna problemático porque Teresina não é resiliente ou adaptada às condições.

“Teresina é uma capital chuvosa. A nossa média histórica de chuva oscila entre mil e duzentos a mil e quatrocentos milímetros, é muita chuva, entende? Porém, Teresina vem perdendo essa chuva, as temporadas chuvosas têm sido cada vez mais irregulares. Alguns meses, por exemplo, o mês de dezembro, que já foi considerado chuvoso, perdeu a sua essência. O mês de abril, que já foi considerado chuvoso, perdeu a sua essência. A gente sempre trabalhava com a perspectiva de cinco meses, reduziu para quatro, agora a gente tem a possibilidade de três meses chuvosos com as mudanças que estão acontecendo no clima. E um detalhe muito importante, essa perda e essa irregularidade se manifestam com a possibilidade de chuvas intensas, de chuvas extremas. Como é uma cidade pouco resiliente, pouco adaptada a essa condição, quando a chuva cai, ela provoca transtorno, alagamento, às vezes enxurradas, ruas que se transformam em verdadeiros rios”, argumenta o diretor de Prevenção e Mitigação da Secretaria de Estado de Defesa Civil.

Foto: Lucas Dias/GP1
Chuvas causam congestionamento em Teresina

Mas, afinal, quais ações devem ser tomadas contra as mudanças climáticas?

Quando abordamos que Teresina sofre já com as mudanças climáticas, nos vem o questionamento do que precisa ser feito então para combater essas alterações. Entre as principais medidas, existe a necessidade de reorientar o processo de arborização da capital do Piauí e a importância de utilizar soluções de engenharia avançada mais acolhedora. “Uma das medidas fundamentais para diminuir este impacto é reorientar o processo de arborização, preservando as áreas verdes já existentes e criando realmente uma estratégia de manutenção dessas áreas e de ampliação dessas áreas, preferencialmente com espécies nativas, com espécies adaptadas à nossa condição climática. Outro passo é utilizar as soluções de engenharia, nós temos hoje na mais avançada engenharia e arquitetura novos materiais que têm uma capacidade de absorção da energia de ondas longas, que é o infravermelho, que produz o calor, muito menor. E a gente pode adaptar esses prédios para serem espaços mais acolhedores”, pontua Werton Costa.

Além disso, Teresina precisa também se dispor para mudanças no comportamento individual, como a maneira que as pessoas lidam com os rios, o lixo e o cuidado com o próprio corpo, precisando adotar hábitos mais adequados à temperatura. “O outro aspecto diz respeito ao foro íntimo, a conduta das pessoas em relação ao rio, ao lixo, ao cuidado com o próprio corpo. Teresina é uma cidade que precisa ter hábitos mais adequados com a nossa temperatura, do ponto de vista da atividade física, do ponto de vista da vestimenta, do ponto de vista dos horários de funcionamento dos equipamentos públicos. Por exemplo, a gente poderia ter um calendário escolar adaptado. A gente diminuiria o consumo de energia elétrica, a gente diminuiria a probabilidade de uma exaustão física das nossas crianças. Então, a gente precisa ter um pensamento ampliado, humanizado e empático, colocando a variável do clima em todas as políticas públicas da cidade”, complementa o professor.

Foto: Lucas Dias/GP1
Professor e diretor de Prevenção e Mitigação da Secretaria de Estado de Defesa Civil, Werton Costa

E para as chuvas? O que deve ser feito?

No que diz respeito às chuvas, é preciso educar a população sobre o “novo normal” das mudanças climáticas e os riscos associados às áreas mais suscetíveis a alagamentos. Também é necessário a implementação de soluções, como galerias pluviais e sistemas de drenagem eficientes e seguros. “Em relação às chuvas, é uma cidade grande, ela precisa ampliar o seu olhar sobre as possibilidades de risco, primeiro educar a população para esse novo normal, das mudanças climáticas, que as pessoas possam compreender qual o grau de risco a que estão submetidas nas áreas mais baixas, que são suscetíveis a alagamento, nas áreas mais altas que são processos perigosos torrenciais. Mas também nós precisamos apostar em soluções de engenharia avançada para criar todo um novo conjunto de galerias pluviais, de sistemas de drenagem eficientes e seguros, conscientizar a população da importância de manter esses sistemas limpos, nada de lixo em galeria, nada de bueiros entupidos ou bueiros se transformarem em armadilhas mortais para ciclistas, para motociclistas, para pedestres, a gente precisa garantir que essas áreas estejam devidamente sinalizadas para que as pessoas não sejam pegas de surpresa”, dissertou.

E se as ações não forem realizadas? Qual futuro Teresina pode ter?

Quando passamos a abordar ações para combater mudanças climáticas, precisamos também em nos preocupar sobre o futuro que nos espera caso as medidas não sejam tomadas. Ao longo dos anos, Teresina vai tornar uma cidade cada vez mais quente e insalubre, com desconforto térmico, tornando-a suscetível a uma variedade de doenças, incluindo doenças psicológicas e nervosas, como estresse e depressão. Além disso, pode ocorrer um aumento no número de pessoas hospitalizadas por arboviroses, desidratação, doenças respiratórias e alergias, o que leva a sobrecarregar o sistema de saúde pública.

“Infelizmente, se nós não tomarmos uma posição, tomarmos uma atitude, não reorientarmos o planejamento urbano da cidade de Teresina buscando construir essa resiliência, a gente sabe que a temperatura da cidade está numa crescente, uma cidade mais quente é uma cidade insalubre, uma cidade com desconforto térmico é uma cidade suscetível a doenças de toda a natureza, doenças psicológicas, nervosas, você tem o estresse, a depressão, que tem um vínculo com as temperaturas elevadas, você tem um número maior de pessoas internadas por arboviroses, um número maior de pessoas internadas por desidratação, por doenças no trato respiratório, doenças alergênicas, então tudo isso afeta o sistema de saúde pública do município”, fala Werton Costa sobre as consequências.

Foto: Marcelo Cardoso/GP1
Pôr-do-sol em Teresina Piauí

Além dos problemas relacionados ao calor, os desafios trazidos pelas chuvas ocasionam doenças tradicionalmente transmitidas pela água e, além disso, trazer prejuízos econômicos comprometendo a mobilidade urbana, danificando ruas e estradas vicinais na área rural e também, pode causar danos materiais significativos às residências, afetando até o sistema de transporte público.

“Em relação às chuvas, além das doenças de veiculação hídrica que são tradicionais, a gente sabe que a chuva traz prejuízos econômicos. Ela pode comprometer a mobilidade urbana, ela pode comprometer ruas, estradas vicinais na área rural, ela pode trazer prejuízos materiais impactantes nas residências e até mesmo no sistema de transporte público”, finalizou.