Enquanto o mundo diz adeus a Elizabeth II, Charles assume o trono diante de um cenário desafiador, se tornando a peça central de um complicado quebra-cabeça para manter a unidade do Reino Unido e preservar a monarquia. Mas não tem sido fácil ser rei.
Em apenas dez dias como líder da família real britânica, ele já teve de lidar com manifestações contra a monarquia e ameaças de países da comunidade britânica que desejam virar repúblicas. Charles III vem demonstrando irritação com funcionários e com as especulações sobre seu estado de saúde, após uma foto de suas mãos se tornar assunto nacional.
Segundo especialistas ouvidos pelo Estadão, uma das primeiras tarefas será conter o burburinho separatista da Escócia e evitar um referendo sobre a reunificação das Irlandas. “Se a Escócia se tornar independente durante o reinado de Charles, ele continuará sendo rei. No entanto, seria um golpe no seu prestígio”, disse Robert Hazell, professor da University College London.
Outro foco de atenção será a integridade da Commonwealth, associação de 56 países dos quais 14 ainda têm o monarca da Casa de Windsor como chefe de Estado. Durante seu reinado, a rainha cultivou relações pessoais amigáveis com muitos líderes da comunidade britânica, mas Charles não tem o carisma e o prestígio da mãe.
Repúblicas
“Vários países da Commonwealth indicaram que pretendem avançar para ter presidentes como chefes de Estado, incluindo a Austrália”, afirmou Robert Blackburn, professor de direito constitucional no King’s College London.
Seguindo o exemplo de Barbados, que se tornou república no ano passado, outros países do Caribe – como Jamaica, Antígua e Barbuda – devem seguir o mesmo caminho.
Segundo Blackburn, o novo reinado pode oferecer as condições para uma reavaliação da monarquia moderna em todo o mundo, talvez até mesmo no Reino Unido. “A conduta de Charles III será um fator determinante nisso”, disse.
”O princípio fundamental da monarquia constitucional é a doutrina da responsabilidade ministerial, segundo a qual o monarca segue o conselho ministerial. Portanto, é vital que ele se abstenha de discursos ou ações que criem polêmica, devendo obedecer a orientação sobre os limites em que pode expressar suas opiniões.”
Manifestações
Especialistas acreditam que a monarquia pode nunca mais funcionar tão bem quanto sob Elizabeth II. Ela governou por 70 anos, tornando-se a monarca que reinou por mais tempo na história britânica, sendo adorada e respeitada dentro e fora do Reino Unido. Ocupar esse vácuo não será fácil.
Nos últimos dias, foram registradas várias manifestações contra a monarquia, com a resposta dura da polícia e crítica de ativistas. Em Londres, Edimburgo e Oxford, alguns manifestantes foram intimidados e alguns chegaram a ser presos.
Custos
Para manter a monarquia relevante, Charles também terá de fazer ajustes não apenas no comportamento tradicional que acompanha a instituição, mas cortando gastos que pesam no bolso do contribuinte – principalmente em um momento de crise econômica.
Analistas esperam que Charles torne a monarquia uma instituição mais enxuta, cortando gastos com a redução no número de membros graúdos da realeza. Para Blackburn, a Casa de Windsor cumpre a função de ser um símbolo do Estado, uma força unificadora e um processo conveniente para legitimar várias formas de negócios do governo. “No entanto, a monarquia em uma democracia continua sendo uma anomalia.”
Já Hazell acredita que a família real representa estabilidade, continuidade e tradição, mas também deve acompanhar as mudanças na sociedade. “O apoio à monarquia tem sido forte e estável há muito tempo, mesmo em períodos difíceis. E é provável que esse cenário continue assim”, afirmou.
“Charles já mostrou que tem consciência da necessidade de manter a monarquia relevante, visitando Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte na primeira semana de reinado. Ele encontrará outras maneiras de manter a monarquia relevante, e terá a ajuda do príncipe William e da geração mais jovem.
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