Doze candidatos disputam neste domingo, 10, o primeiro turno da eleição presidencial francesa. As pesquisas apontam uma disputa acirrada entre o presidente, Emmanuel Macron (República em Marcha), e a candidata de extrema direita Marine Le Pen (Reunião Nacional), que protagonizou um crescimento impressionante na reta final de campanha.
Após uma queda de quase 5 pontos porcentuais, Macron tem 26,5% das intenções de voto. Le Pen, 23%, segundo pesquisa Ipsos. Em terceiro lugar aparece o representante da esquerda radical, Jean-Luc Mélenchon (França Insubmissa), com 16,5%.
Se as urnas confirmarem as pesquisas, será uma eleição histórica para a extrema direita, que pode conquistar mais de um terço dos franceses e chegar ao segundo turno mais forte do que nunca. Os outros candidatos da extrema direita, Éric Zemmour e Nicolas Dupont-Aignan, têm 11,5% das intenções de voto.
Apatia Eleitoral
A eleição vem sendo acompanhada com uma apatia incomum na França, onde política se discute a toda hora. A campanha teve menos comícios, em razão da pandemia. Além disso, a invasão russa à Ucrânia, em fevereiro, capturou a atenção geral. “É uma campanha que não vingou entre os eleitores. A falta de debates, as notícias sobre a guerra da Ucrânia. Isso tudo anestesiou o público e reduziu as questões da política interna”, afirma o cientista político Thomas Vitiello, da Sciences Po, de Paris. Como resultado, pesquisas apontam que a abstenção no primeiro turno pode ser recorde: 31% dos franceses não têm certeza se sairão de casa para votar. Em 2017, o número foi de 22,2%.
Atendente em uma mercearia de Paris, Julien está entre eles. “Tudo é igual, nada muda e os candidatos não trazem nenhuma contribuição real para resolver nossos problemas. Só sabem falar de imigração, da Otan.” Ele, que já votou nos socialistas e ajudou a eleger Macron, desta vez não sabe se vai votar. “Vamos ver. Se não estiver chovendo”, diz.
“Há uma sensação crônica de insatisfação em relação ao funcionamento da democracia. A maioria dos franceses acha que ela não vai bem. Isso se soma a um certo cansaço de candidatos que não oferecem, ao menos não de maneira clara, uma solução para os problemas do país”, afirma Vitiello.
Revanche
O fracasso da união de partidos da esquerda (Socialista, Comunista, Ecologista e França Insubmissa) e o desempenho fraco da direita tradicional, de Valérie Pécresse (Os Republicanos), antecipou a sensação de que o duelo do segundo turno, marcado para o dia 24, será uma revanche de 2017, entre Macron e Le Pen.
Durante a campanha, Zemmour usou o discurso nacionalista e supremacista, mobilizando a questão identitária em um grupo mais radical da população com frequentes citações à teoria conspiratória da “grande substituição” de Renaud Camus, segundo a qual os árabes tomarão a Europa.
Com isso, Le Pen tornou-se uma candidata viável, como explica Sylvie Strudel, professora da Universidade Panthéon-Assas, em Paris. “Graças a Zemmour, Le Pen dá a impressão de ser menos extrema.”
Mesmo sem ter alterado seu programa nacionalista e conservador, Le Pen ganhou pontos ao concentrar sua campanha em temas econômicos e propostas para ampliar o poder de compra do francês, tema que mais preocupa o eleitorado.
“Ela está menos radical”, afirma a enfermeira Madeleine, eleitora de Le Pen, que votou na esquerda até 2017. “Ela é a única que pode derrotar Macron e eu não aguento mais”, diz Madeleine, após dois anos de pandemia. “A situação dos hospitais públicos só piora. Os franceses já sofreram demais.”
Para os opositores do presidente, Emmanuel Macron, a eleição presidencial francesa é um plebiscito em relação ao governo. O presidente, no entanto, demorou a entrar em campanha e se tornou figura ausente nas discussões políticas.
Macron esperou até março para oficializar sua candidatura à reeleição. Com vantagem nas pesquisas, ele decidiu manter sua posição nas negociações com a Rússia sobre a Ucrânia e deixar de lado eventos eleitorais, realizando apenas um comício oito dias antes da votação.
Além disso, o presidente rejeitou diversas entrevistas e deixou de participar de encontros com outros candidatos na imprensa, “o que foi visto negativamente como uma fuga do debate”, afirma a analista Sylvie Strudel. “O resultado dessa campanha inábil foi uma queda abrupta na reta final, voltando ao mesmo patamar de outubro de 2021.”
A queda de Macron, somada ao forte repúdio à imagem do presidente, preocupa os macronistas. Ele foi eleito em 2017 com forte apoio de eleitores de esquerda e da direita tradicional, em um movimento de união já conhecido no país para barrar a chegada da extrema direita ao poder – como ocorreu em 2002 contra Jean-Marie Le Pen, pai de Marine Le Pen.
Cartilha liberal
Uma vez no poder, o presidente seguiu uma cartilha liberal na economia, com o fim do imposto sobre grandes fortunas, uma política de austeridade, redução dos benefícios sociais e do tamanho do Estado. Em 2018, ao implementar um imposto sobre combustíveis, Macron despertou a ira da população, já afetada em seu poder de compra. Era o início do movimento dos coletes amarelos, que parou a França ao longo de meses.
Assim como os protestos reuniram eleitores da esquerda à direita contra Macron, a eleição presidencial pode unir esquerdistas e direitistas que pretendem impedir sua reeleição.
Em uma mercearia do 14° Distrito de Paris, a aposentada Laetitia se diz decepcionada com os cinco anos de governo Macron. Ela, que é eleitora do Republicanos, considera que o presidente “não conhece a França de verdade”, e dá como exemplo a alta dos preços dos alimentos. Após a pandemia, e com a guerra na Ucrânia, o país vive uma inflação de 4,5%. O que a aposentada fará em um possível segundo turno entre Macron e Le Pen? “Ainda não sei. É um cenário horrível.”
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