Após sucessivas derrotas na Câmara, o governo conseguiu aprovar a medida provisória que reestruturou o número de ministérios na gestão Jair Bolsonaro, mas o Centrão seguiu o script que traçou desde o início e retirou o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) das mãos do ministro da Justiça, Sérgio Moro. O órgão volta para o Ministério da Economia.
A votação foi apertada. Com uma diferença de apenas 18 votos – o placar foi 218 a 210 –, o governo não conseguiu evitar o novo revés imposto pelo Centrão, mais uma vez aliado a partidos de oposição. Deputados justificaram que em vários países o órgão de inteligência financeira é vinculado ao Ministério da Economia e não faria sentido só o Brasil mantê-lo na Justiça apenas para agradar Moro.
- Foto: Dida Sampaio/Estadão ConteúdoCâmara dos Deputados
“Se ele for para o Ministério da Educação, vai levar o Coaf junto?”, questionou o deputado Paulo Teixeira (PT-SP).
O líder do governo, Major Vitor Hugo (PSL-GO), contra-argumentou dizendo que o Brasil poderia inovar e ser seguido por outros países ao deixar o Coaf na Justiça. Segundo ele, essa configuração atende aos anseios dos “57 milhões de brasileiros que elegeram Bolsonaro com a bandeira do combate à corrupção”.
Em discursos no plenário, deputados do PSL apelaram para os atos de apoio ao governo e a Bolsonaro marcados para o próximo domingo. O deputado Felipe Barros (PSL-PR) chegou a ser vaiado por parte dos colegas ao citar as manifestações num tom de ameaça. “Não é manifestação convocada pelo presidente Jair Bolsonaro, mas pelo povo”, disse. Na pauta dos protestos, convocados pela rede bolsonarista, está justamente a defesa da manutenção do Coaf com Moro.
O ministro da Justiça não escondeu sua decepção com o resultado, que é mais uma derrota para sua gestão. “Lamento o ocorrido. Faz parte do debate democrático. Agradeço aos 210 deputados que apoiaram o Ministério da Justiça e o plano de fortalecimento do Coaf”, afirmou ao Estado. A interlocutores, o ministro disse que caberá à Casa Civil decidir se o governo vai trabalhar para reverter a derrota no Senado. A dificuldade do Planalto é que qualquer alteração no texto fará com o que a MP volte a ser analisada novamente pela Câmara. Este vaivém pode fazer com que a medida perca a validade. O prazo final é o dia 3 de junho.
Coaf teve participação ativa na Lava Jato
O Coaf teve participação ativa na Lava Jato e sua incorporação à Justiça foi um pedido do ex-juiz a Bolsonaro ao assumir a pasta.
Os partidos do Centrão – DEM, PP, PR, PRB e Solidariedade – deram 87 votos contra Moro dos 118 parlamentares do grupo que voaram ontem. A oposição contribuiu para a derrota com 89 votos, dados por deputados do PT, PSOL, PSB, PC do B e PDT. Todos do PSL, PV, Podemos, PHS, PMN, Cidadania e do Novo presentes na sessão votaram com o governo. Um dos principais articuladores do Centrão, o líder do PP na Câmara, Arthur Lira (AL), se limitou a dizer que o “placar fala por si”.
A líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP), evitou tratar a votação como derrota e sinalizou que o Palácio do Planalto dá o assunto como encerrado. “É do processo democrático. Não existe perder porque o Coaf vai para as mãos do ministro Paulo Guedes. O próprio Sérgio Moro já havia dito que o Coaf está em casa. Agora, é bola para a frente. O processo é democrático e quem atacar o resultado está atacando o processo democrático”, disse.
Apesar da derrota do Coaf, o governo conseguiu evitar a recriação de ministérios. Em votações destacadas, ou seja, feitas individualmente, os parlamentares rejeitaram a recriação dos Ministérios da Cultura e do Trabalho e mantiveram a fusão dos ministérios da Integração Nacional e das Cidades no Ministério do Desenvolvimento Regional, como havia sido aprovado na comissão que analisou MP.
Para lembrar: MP teve mais de 500 emendas
Apresentada em 1.º de janeiro pelo presidente Jair Bolsonaro, a Medida Provisória 870, que reduziu o número de ministérios de 29 para 22, recebeu mais de 500 emendas no Congresso – manter a estrutura da Esplanada do jeito que foi pensada pelo Palácio do Planalto se tornou um desafio para o presidente. A maioria das mudanças previstas partiu da oposição.
O PT pediu 221 alterações e o PSOL, 114. No entanto, houve também nove propostas do próprio partido de Bolsonaro, o PSL, além de siglas mais próximas da base aliada, como PRB e DEM. Para garantir aprovação da medida provisória que alterou estrutura do Executivo, o Palácio do Planalto chegou a dar aval para a recriação de dois ministérios (Cidades e Integração Nacional) – os ministros seriam indicados por parlamentares. No entanto, sob pressão de aliados de Bolsonaro nas redes sociais e às vésperas de atos pró-governo, o Centrão recuou e desistiu de cobrar a volta das pastas.
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